A minha avó
Há dias eu não passo por aqui, ando afundada no trabalho, que é algo que eu amo e que me mantém em pé, quando eu mesma desacredito e pareço cair… Sigo…
Hoje, no entanto, acordei com o propósito de falar sobre nossos avós e sobre o laço afetivo que desenvolvemos ao longo da vida com essa referência ímpar.
Eu fui mesmo muito abençoada, porque tive uma avó MARAVILHOSA, a Maria José.
A “Vó Maria” era mãe do meu pai. Meu pai era o filho caçula de uma família que só tinha mulheres, e a diferença de idade entre ele e as irmãs era bastante grande. Para simplificar, eu quase não tive convivência nenhuma com meus primos por parte de pai porque eles tinham/têm a idade que meu pai teria se fosse vivo.
A minha avó Maria nasceu em 1908, em Teixeira Soares, uma cidadezinha no Paraná que hoje conta com 10 mil habitantes, mas na época em que ela nasceu lá, devia ter menos de mil.
Sei muito pouco sobre a história da minha avó, mas isso foi irrelavante em nossa relação, porque construímos a nossa jornada, que fez toda a diferença em minha vida e na presença dela comigo por apenas 14 anos.
Hoje completa-se 25 anos que ela fez a viagem e, graças a Deus, eu consigo me lembrar do cheirinho de alfazema que ela tinha, o som da voz, a textura dos cabelos e da pele. Essas lembranças, quando não nos escapam, nos tornam ainda mais fortes para seguirmos, porque sempre estão associadas a coisas boas, um cheiro de lar e de amor.
Quando eu nasci, a minha avó já tinha outros netos “prediletos”, mas isso não impactou em nossa relação, muito pelo contrário, eu ganhei o meu espaço. Nós éramos amigas, mãe e filha, que sorte a minha, que sorte a nossa! Conheci alguns irmãos dela, dos quais não lembro, exceto a tia Dita – A Benedita, que faleceu anos antes dela.
Tive a sorte de ser vizinha da minha avó, e por isso, convivi com ela diarimente!
Minha avó brincava de boneca comigo, fazia picnic no jardim, me ensinou a plantar e a colher flores, couves, cebolinha. Fazia trança nos meus cabelos, amava flores e era vidrada em novela a ponto de xingar os personagens em voz alta, sim ela fazia isso, e ainda respondia ao boa noite do Cid Moreira, no Jornal Nacional.
A minha vó era independente, gostava de se arrumar, fazer compras no centro da cidade, comprar os pasteis da pastelaria da Voluntários da Pátria (que já não existe mais). Cuidava do seu imenso jardim de rosas, se vestia bem, cozinhava que era uma maravilha. Era mãe, confidente, conselheira, mas sabia ser áspera quando necessário.
Era ela quem buscava a mim e a minha irmã na escola, fazia bolinhos de chuva com açúcar e canela e levava para o meu pai, juntamente com uma garrafa de café, nas noites frias em que ele ficava trabalhando na oficina dele (meu pai tinha como hobby a marcenaria, não raro, ele chegava do trabalho e ficava até muito tarde trabalhando em sua oficina, em casa).
Lembro dos Natais na nossa casa, quando ela escondia os presentes na casa dela, dos almoços de domingo, que era uma garrafinha de Coca-Cola para mim e uma de Fanta para a minha irmã, religiosamente. Lembro da forma como ela ia comprar sapatos para nós: media um fio de barbante na sola do pé. Do disco da Xuxa que ela comprou pra mim, mas eu já tinha… hahaha.
Lembro do rádio que ficava em cima da mesa, com um copo com água na frente, porque ao meio-dia tinha a benção do Papa, assim como lembro dos programas que ficavam rodando o dia todo, sempre na mesma emissora AM – A Rádio Independência.
Lembro também de passar a tarde desenhando na sala da casa dela, éramos somente nós duas, raras vezes, minha irmã mais nova estava junto conosco. Lembro dos chás que ela fazia para nós com bolacha Maria, do bolo de fubá, do pão caseiro que ela me dava para modelar e eu ia modelar na escada, fazia bonequinhos e colocava feijões no rosto e ainda queria que ela os assasse para eu comer.
Tenho as melhores lembranças dessa mulher sensacional que foi a minha avó e só lamento muito que quando ela partiu eu fosse ainda tão jovem, a ponto de não poder fazer mais por ela, de não poder levá-la aos lugares que certamente ela gostaria de conhecer, de não poder dividir com ela coisas que hoje, com certeza, ela teria as melhores soluções e conselhos…
Os tempos eram outros, obviamente, mas tenho certeza que se estivesse entre nós, minha avó condenaria com veemência esses avós que deixam as crianças $#%&* na cabeça deles. Longe de mim, mas tenho visto cada coisa por aí, permissividade e pais extrapolando.
Meus pais sabiam de suas responsabilidades e nunca deixaram os filhos ao encargo dos avós, de nenhum deles, seja paterno ou materno. Na minha família nunca teve essa de terceirizar não, porque o ditado de “Quem pariu Matheus que o embale”, sempre fez sentido.
Meus pais, assim como meus tios, arcaram com as suas escolhas, sem essa de sobrar para os avós que, justiça seja feita, já criaram seus filhos e não têm que ficar adulando a geração (atual e cada vez pior) que faz o que quer e que os pais não dão conta. Crítica feita, recado dado. Respeitem seus pais, eles não são obrigados a conviver com os filhos que vocês não souberam educar. Ter filhos foi uma escolha sua, não deles! Respeite a velhice deles!
Nossos avós são referência de história de vida. Cada qual teve a sua, difícil ou não, mas merece, respeito enquanto vivos. Precisamos de nossos avós para construirmos as nossas histórias. Quem não tem ou não conhece aquela “receitinha de vó”?
Em 1995, com a saúde debilitada, mas em plena lucidez, minha Maria não aguentou e partiu aos 87 anos, deixando uma vida inteira de lembranças e saudades. Eu tinha 14 anos na época, e me lembro dessa partida como se fosse hoje.
A minha avó vive em mim, e eu tenho tanto orgulho dela, mas tanto… Ela teve uma vida bastante difícil, o marido era alcoólatra, tempos depois teve paralisia, e ela teve que, literalmente, carregar uma família nas costas. Trabalhou como doméstica e se estabeleceu no serviço público, onde se aposentou e conseguiu dar uma vida digna aos filhos e também ajudar aos netos.
Ainda guardo a boneca de pano que ganhei de você, Vó, pouco antes da sua partida, quando ainda você me chamava e dizia: “Jana, venha para o colo da vovó!”
A sua sombrinha, me perdoe, ficou com a Lígia, e como ela já se foi, não há a menor possibilidade de resgate.
Tenho uma caixa (de pandora) de metal com seus trabalhos em crochê, foto, aquele cálice de vinho pequeno e o porta-joias. Guardo também aquele relógio que é um broche e uma saudade infinita.
Minha avó, onde quer que você esteja, saiba, sinto saudades e sou muito grata pela sua vida e pela sua passagem por aqui, pela permanência em mim e por me nutrir, mesmo que distante. Espero que tenha orgulho de mim… A gente ainda vai se encontrar.
Obrigada pelas visitas que me faz em sonho.
Até breve!