Sobre as dores dos outros
Eu proponho hoje uma reflexão: o quanto somos tolerantes e sensíveis às necessidades e dificuldades dos outros?
Nos jogos Olímpicos de Tóquio, a ginasta Simone Biles foi aplaudida e fortemente apoiada ao declarar que iria desistir de algumas finais porque precisava cuidar da sua saúde mental. Foi um ato de extrema coragem e eu não sei se eu, no lugar dela, iria me mostrar tão vulnerável aos olhos do mundo.
Segundo Brené Brown, professora norte-americana, é preciso ter coragem para ser vulnerável para o outro, por mais paradoxo que isso possa parecer.
Biles parece ter dado voz a milhares de pessoas que sofrem por conta de doenças mentais no mundo. Gente com depressão, ansiedade e vários outros transtornos que interferem na nossa qualidade de vida, no nosso trabalho e nos nossos relacionamentos interpessoais.
Mas será que boa parte do mundo aplaudiu a sua atitude porque, na verdade, ela está longe demais de nós pobres mortais?
Deixe-me explicar: o que ela confidenciou parece ser uma história de vida e algo que está bem distante da nossa realidade. Nós não estamos implicados e não estamos no círculo próximo de relações que a ginasta possui. Assim, muita gente comenta, aplaude ou reclama, mas no dia seguinte a vida continua e quase ninguém pensa mais nisso.
E com as pessoas que estão do nosso lado – nossos pais, irmãos, maridos, esposas, filhos, colegas de trabalho, amigos e outros –, o quanto estamos dispostos a escutar, a acolher e a compreender as suas dificuldades emocionais? Aplaudiríamos àquelas pessoas próximas que têm a coragem de dizer que não está bem?
A questão é que é muito difícil conviver com pessoas próximas que tenham algum transtorno mental ou emocional. A pessoa não sofre isolada, ela não é uma ilha, então ela afeta o seu entorno. E nós temos a tendência em querer buscar o prazer a todo momento.
Fazemos parte de uma sociedade hedonista que não tolera pessoas tristes, com raiva, amarguradas, frustradas, desmotivadas e queixosas.
Discriminamos, fugimos delas, não convidamos para perto de nós e queremos nos afastar. Alguém já parou para pensar que pessoas assim sofrem e não podem se dar ao luxo de parar com tudo para dizer ao mundo que precisam cuidar de sua saúde mental?
Em meu consultório recebo muitas pessoas que sofrem caladas.
Nas empresas em que trabalham não abrem a boca para dizer que estão em sofrimento por medo de serem julgadas e demitidas. Boa parte dos amigos dessas pessoas são especialistas em conselhos do tipo “sai dessa, cara”; e a família sofre junto, entra em conflito e muitas vezes rompe relacionamentos.
Qual é a saída? Não sei, é uma reflexão apenas. Eu só queria que nós (e eu me incluo nessa, porque também não sou tão tolerante o tempo todo), acolhêssemos mais quem está do nosso lado ao invés de parabenizar e glorificar personalidades do esporte, do cinema e das redes sociais para fingir aos outros que somos pessoas sensíveis às dores dos outros. Será que somos mesmo?
Juliana Corrêa Schwarz, psicóloga na abordagem cognitiva-comportamental, mestra em educação e professora na Estácio Curitiba