Sono e obesidade: qual é a relação?
A combinação de hábitos alimentares inadequados, sedentarismo e poucas horas de sono impactam no excesso de peso corporal
Já é bem descrito, há longos anos, que o sedentarismo e hábitos alimentares inadequados são importantes fatores de risco para obesidade e suas inerentes comorbidades (diabetes e dislipidemia). Entretanto, dormir mal, seja devido tempo insuficiente ou um sono de baixa qualidade, é outro comportamento que influencia de maneira colossal para o excesso de peso corporal.
“Porém, mesmo o sono sendo uma necessidade biológica inegociável e que regula majestosamente o organismo, incluindo a composição corporal, é negligenciado por grande parte das pessoas, inclusive para quem já demonstra certa preocupação com estética e saúde”, enfatiza Rafael Genario, nutricionista, doutorando em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP e professor na pós-graduação da Faculdade UNIGUAÇU.
O ganho de peso só acontece quando ocorre um cenário de superávit calórico, ou seja, um maior consumo de calorias, enquanto há um menor gasto. Isso comumente é facilitado pelo sedentarismo, propiciando menor gasto calórico, e por hábitos alimentares inadequados que propiciam maior consumo energético, em especial o excesso no consumo de alimentos ultraprocessados que, em grande maioria, é abundante em calorias e com baixo valor nutricional. Entretanto, dormir mal também é um facilitador nesse processo. E isso acontece por três principais motivos, que são:
1) Dormir mal aumenta a fome e diminui a saciedade: alguns estudos relatam que noites mal dormidas, em especial as condições de privação de sono grave (dormir 5 horas ou menos), promovem um desequilíbrio em hormônios que regulam o apetite. O hormônio que sinaliza a fome, conhecido como grelina, fica mais elevado, principalmente no período noturno. O hormônio que sinaliza a saciedade, conhecido como leptina, acontece o oposto. “Esse cenário desajustado, por fim, facilita um maior consumo de calorias que pode chegar próximo de 400 kcal ao longo do dia (menos ou mais, dependendo a pessoa)”, pontua Genario.
2) Dormir mal altera a homeostasia de circuitos cerebrais envolvidos com nosso comportamento alimentar: será que essa fome aumentada é por salada, frutas, alimentos saudáveis? Presumimos que não!
Já é bem elucidado pela ciência que dormir mal altera a homeostasia de algumas regiões cerebrais que estão intimamente ligadas ao comportamento alimentar, em especial as conectividades entre córtex pré-frontal e a região límbica. Dormir mal gera maior necessidade de consumir alimentos hiper palatáveis, ou seja, aqueles com excesso de calorias, gordura saturada, sódio e aditivos. “Além de haver um aumento considerável de calorias em detrimento da fome desregulada, há um aumento no consumo por alimentos com baixo ou nenhum valor nutricional importante”, relata o nutricionista.
3) Dormir mal gera menor motivação para a prática de exercícios: lembra da história do superávit calórico?
É nítido que dormir mal facilita uma parte, o maior consumo calórico. Mas uma gama de trabalhos científicos já alerta para a outra parte em detrimento do sono ruim: um menor gasto.
Noites mal dormidas promovem importantes alterações neurofisiológicas envolvidas com a tomada de decisões e motivação. Matthew Walker, neurocientista renomado e autor do livro “por que nós dormimos?”, demonstrou em suas pesquisas científicas que pessoas com sono inadequado ficam menos motivadas para praticar exercício, apresentam comportamentos mais depressivos e evitam contatos sociais.
“Bom, esse tema é fascinante para mim, tanto que parte do meu doutorado se debruça sobre o sono. Recentemente, e, referente à essa relação de sono e obesidade, publicamos um artigo científico na revista Scientific Reports no qual descrevemos um importante achado: idosos obesos que possuíam baixa qualidade de sono apresentavam maior percentual de gordura, além de piores parâmetros de massa muscular, força, qualidade de vida, ansiedade e depressão, em comparação a idosos obesos com boa qualidade de sono”, observa Rafael.