E essa história de tratar bem a si mesmo?
Parece tão mais fácil falar sobre compaixão do que sobre Autocompaixão. Nós falamos muito sobre empatia, sobre se colocar no lugar do outro, compreender o que o outro está passando, ser gentil e perdoar. O outro. E quanto a nós mesmos? Será que nos empenhamos em sermos gentis com a gente mesmo tanto quanto cuidamos do outro?
Eu sei o que você pode estar pensando: se eu não for duro comigo mesmo vou relaxar, ficar preguiçoso, não vou ser produtivo e vai ser mais uma desculpa para postergar e procrastinar. Calma. A minha proposta é que você seja gentil com você mesmo pelo menos para ler este texto, e então formar uma opinião. Tudo bem, muitas pessoas têm desconfiança quanto a serem autocompassivos. Não seria o oposto de ser uma pessoa forte e resiliente?
Pensando em mim, eu não estaria sendo egoísta e deixando de pensar nos outros? Se eu não for duro comigo mesmo, não estaria renunciando aos meus objetivos? Não é a autocrítica que me direciona para o sucesso? A resposta para todas essas perguntas é: não, embora insistentemente nossa cultura ocidental tente nos dizer que sim.
A Autocompaixão, ao contrário de todos esses mitos, na verdade ajuda as pessoas a se tornarem mais conscientes e compassivas com os outros, a aumentarem a conectividade social, aumenta a satisfação na vida e diminui sintomas de depressão e ansiedade.
Além disso, nos ajuda a não evitarmos nossos sentimentos negativos, o que além de não resolver, acaba intensificando esses sentimentos (mas esse é um papo para outra hora).
Desenvolver uma atitude autocompassiva na vida é um processo complexo e que nunca tem fim, sempre estamos buscando a Autocompaixão, mas não é uma meta a ser alcançada (oba, agora sou um ser compassivo! – não). O caminho para alcançar a Autocompaixão é a Autocompaixão em si. Sem mais delongas, vamos para a explicação…
A Autocompaixão envolve tratar a si mesmo como você trataria um amigo que está passando por dificuldades, considerando que você é uma pessoa boa que se preocupa com seus amigos.
É uma prática na qual aprendemos a ser um bom amigo para nós mesmos quando precisamos, e nos tratarmos com gentileza ao invés do nosso modo padrão, de cobranças, críticas e julgamentos. Para saber se você já é autocompassivo, responda a seguinte pergunta: nós costumamos tratar aos outros como nós gostaríamos de ser tratados. Porém, como seria se você tratasse os outros como trata a si mesmo?
Se a resposta te assustou um pouco, é um indicativo de que um pouco de gentileza consigo mesmo faria muito bem. Vamos lá então. De forma muito simplificada (e um tanto rasa), como ser autocompassivo? Primeiro, empregando o exercício de autobondade – quando cometemos uma falha, ao invés de nos criticarmos profundamente, compreender que todas as pessoas falham, e então oferecer a nós mesmos uma aceitação incondicional, nos acalmando e confortando assim como nossos amigos, pais e avós (se amorosos) fariam.
Reconhecer que todos os seres humanos são uma obra em andamento, com possibilidade de falha, com sofrimentos e lutas, e se colocar dentro dessa humanidade compartilhada é um bom caminho para a Autocompaixão. Afinal, se todos podem errar, falhar e sofrer, por que você não pode? Faça carinho em você mesmo. Como assim??? Isso mesmo.
Antes de dormir, reconheça o quanto você venceu e o quanto foi incrível – por ter saído da cama mesmo com o mundo da forma como está, por ter dado bom dia para as pessoas, por ter tomado um banho e alimentado seu corpo. A seguir, faça carinho no seu rosto, repouse a mão em seu coração e agradeça a si mesmo (na primeira vez vai ser esquisito, mas eu juro que depois melhora). Ninguém é insuficiente a ponto de não merecer um carinho, e esse afago pode sim vir de si mesmo.
Sem a pretensão de esgotar o tema, essa foi uma pincelada no que é a Autocompaixão e como ela pode nos ajudar a estarmos nessa jornada de uma forma um pouco mais leve, porque tudo não precisa ser tão pesado, não é mesmo? O mundo já tem crueldade o suficiente, então vamos fazer carinho em nós mesmo e espalhar um pouco mais de gentileza – para fora, e principalmente para dentro.
Marjorie Rodrigues Wanderley, psicóloga, professora da Estácio Curitiba, Mestre em Psicologia Clínica pela Universidade Federal do Paraná