Saudade

Leia ouvindo: Palpite – Vanessa Rangel

 

O que resta quando não há mais sentido? Pode ser a saudade. “A gente pode ter saudade”, disse a psicanalista Maria Homem em um vídeo que vi esses dias. E fiquei pensando nisso, naquilo que nos autorizamos a ter e sentir. Porque, não raro, é muito difícil nos darmos permissão para sermos humanos, apenas humanos. Apenas errantes, vacilantes e inconstantes.

Vestimos as máscaras de profissionais exemplares, mulheres que dão conta de tudo… E compramos essa falácia dia após dia. Até que se apresenta algum encontro com o real, como nos nomeia Lacan. E pode ser uma morte, por exemplo. Acredito ser esse o maior dos encontros com o real, a maior privação da vida. Diante disso, se descortina um caminho de luto, com muitas fases, altos e baixos. Um momento que exige um tempo próprio para simbolizar a experiência.

No meio do caminho não dá para pensar em saudade, só depois. É só lá na frente, quando aceitamos a perda, que conseguimos ter saudade, enxergar o que carregamos daquilo, o quanto enriquecemos na jornada. Falo isso pensando em mortes da carne, sim, mas também em pequenas mortes, como separações conjugais e demissões. No olho do furacão ainda estamos realizando a perda, articulando lutos anteriores e tentando autorizar o outro a nos deixar, segundo Christian Dunker, outro psicanalista.

Ele ainda nos lembra: “Há algo de incurável no luto. O que se pode é fazer algo com essas marcas”. Para mim, esse algo é a saudade. É ter saudade. Porque o saudosismo é saudável e reconfortante. Nos salva de muita coisa.

 

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