Eterno Calligaris

Leia ouvindo: Pode se achegar – Tiago Iorc e Agnes Nunes

 

“Espero estar à altura”. Diante da proximidade da morte, essa foi a frase do meu pai. Assim disse Max, filho do psicanalista italiano mais brasileiro que já existiu, Contardo Calligaris, que partiu essa semana.

Sempre que um pensador morre, me ocorre um mesmo sentimento. Esse encontro com o real, até então impossível, não passa ileso. Sempre penso e sinto que nós, admiradores, ouvintes e leitores de suas ideias, também morremos um pouco. Bem nesse momento. Nesse choque com o real. Nessa pedrada.

Me parece que finda, assim, uma esperança generalizada de beber mais daquela fonte. De se espantar com algum posicionamento. De ver alguma coisa por outro ângulo. De emprestar um pouco do pensar que encanta. De experimentar conexões imprevisíveis.

Mas a obra vive. Calligaris deixou um grande legado, não somente para os psicanalistas. Seu estilo, sua penetração midiática e a escolha pela exposição da área (em uma época muito menos showbiz que essa que vivemos) foram desejos que ele bancou. Por si só, esse “ser quem tu és” já basta para as devidas reverências.

Se você deu o play na música de hoje, está ouvindo o refrão:

“…Pode se achegar

Já era hora, tome teu lugar

O que eu mais quero é tua companhia

Agora sei o que antes não sabia

O bom da vida é dividir o dia

E degustar a dor e a alegria…”

É sobre ele. E sobre isso que ele mesmo falava: “É preciso sentir plenamente as dores: das perdas, do luto, do fracasso. Eu acho um tremendo desastre esse ideal de felicidade que tenta nos poupar de tudo que é ruim”. Porque a parte ruim existe mesmo. Essa partida é prova disso.

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