Mulher maravilha da pandemia?

Ser multitarefa tem sido tradicionalmente percebida como uma habilidade feminina, no entanto a atividade está mais relacionada ao acúmulo de funções do que à competência. Com a pandemia do Covid-19 e as mudanças na rotina muitas mulheres dobraram a quantidade de tarefas realizadas.

As mães que trabalhavam fora, foram obrigadas a equilibrar o home office com os estudos dos filhos, cuidados com a família e administração da casa. Não que isso não possa ser feito, mas sem organização torna-se um malabarismo perigoso com gatilhos como ansiedade, estresse e depressão que prejudicam quadros de uma das enfermidades que mais afetam as mulheres, as doenças reumáticas.

Com as mulheres representando mais de 60% dos casos de doenças reumatológicas no Brasil, sendo elas autoimunes como Lúpus, artrite reumatoide, ou degenerativas como osteoartrite e osteometabólicas como a osteoporose, os estudos sempre tentam buscar o porquê dessa população feminina ser a mais afetada.

Uma grande causa para a incidência ser maior nas mulheres são os hormônios femininos, que passam por alterações bruscas em períodos de gravidez e menopausa, podendo afetar de maneira específica o sistema imunológico. Tanto que muitas das doenças reumatológicas surgem após esses períodos de grande mudança hormonal no organismo. Além disso, o fato de que em muitas culturas (maioria) as mulheres serem as únicas responsáveis diretas pela função de multitarefa, pode levar a um estresse emocional, quadros depressivos e de ansiedade, que podem funcionar como o estopim no sistema imune, levando ao desenvolvimento de tais doenças. Outro fator decorrente de ser multitarefa é o cansaço e a dor musculoesquelética causada diretamente pelas “funções atribuídas à mulher”, o que claramente pode mascarar diagnósticos sérios como artrite, artrose, fibromialgia e até mesmo levar à perigosa automedicação.

Segundo a especialista da Cobra Reumatologia, Dra. Camille Figueiredo é preciso estar muito atenta às dores e aos inchaços nas articulações, principalmente nas mãos, punhos e pés.

Uma coisa é um dolorimento difuso muscular decorrente da sobrecarga de trabalho que envolve atividade física, como é o caso da atividade voltada à limpeza do lar, organização do ambiente, cozinhar, lavar etc. Outra coisa é o sono não reparador, seguido de dor ao levantar, com certa rigidez articular que precisa de “algum tempo” para que os movimentos habituais sejam realizados, além de dor localizada em articulações específicas como punhos e nas pequenas articulações das mãos, acompanhadas ou não de inchaço (edema articular); isso tudo nunca poderá ser encarado como “dolorimento normal de muita atividade”, tem algo acontecendo no organismo, que não é compatível com somente sobrecarga de atividade. E é nesse momento que a busca por atendimento especializado deve ser feita para evitar coisas como: automedicação, que pode mascarar algumas doenças reumatológicas por um certo período de tempo, atrasando o diagnóstico e consequentemente o tratamento dessas doenças, além de em grande parte das vezes levar à destruição óssea e articular, com prejuízo da função, por vezes irreversível, dependendo do atraso no início do tratamento reumatológico. – doutora Camille Figueiredo

 

Dores fortes que se estendem por mais de dois dias não são normais e não devem ser tratadas com analgésicos musculares. É preciso ficar atento se houve alguma lesão ou esforço físico excessivo que justifique a dor, caso contrário um reumatologista deve ser consultado.

Também para as pacientes que já possuem diagnóstico vale lembrar que a rotina e a dieta devem ser regradas para que o quadro reumático não piore. Abaixo a doutora Camille Figueiredo lista algumas dicas de como otimizar a rotina para ter uma vida saudável.

  1. Alimentação saudável: evite ao máximo incluir em sua dieta alimentos industrializados e condimentados. Controle a ingestão de sódio e carboidrato. Dê prioridade a frutas, vegetais e carne e claro, cálcio (leite, queijos e iogurtes, além de folhas verdes escuras).
  2. Adapte o ambiente: busque adaptar o ambiente às suas necessidades, use utensílios que facilitem atividades como abrir latas e potes, por exemplo.
  3. Dê uma folga aos seus pés: utilize calçados confortáveis, com solados rígidos para melhor estabilidade. Evitem saltos, para pacientes que apresentam deformidades e calosidades nos pés decorrentes da artrite reumatoide, recomenda-se sapatos especiais, de acordo com cada problema. Um calçado adequado garante equilíbrio articular e evita quedas (isso inclui retirar tapetes que deslizam e levam a quedas com fraturas, para quem tem fragilidade óssea).
  4. Inclua exercícios físicos prazerosos em suas atividades. O planejamento do programa de atividade física elaborado por um profissional ajudará a trazer ganho de força muscular, flexibilidade e equilíbrio. Além disso, a atividade física ajuda a controlar a doença, com melhora da dor, sono e humor.
  5. Além de exercícios físicos, exercícios que fazem bem à mente também são mais que necessários: inclua algum hobby como leitura, bons filmes, jogos, bordados, pintura, desenhos etc, algo que seja prazeroso ao seu dia a dia.
  6. Se organize e distribua as responsabilidades: ser multitarefas não é obrigação de ninguém. As funções podem ser divididas por todos que moram na casa e, se organizadas podem se tornar até bem-vindas na rotina.

Sobre a doutora: Formada pela Universidade do Estado do Pará (1998), Camille Pinto Figueiredo é responsável pelo braço acadêmico da Cobra Reumatologia. Com residência e doutorado realizados no Hospital das Clínicas (FMUSP) e pós-doutorado pela Friedrich-Alexander-University Erlangen-Nuremberg (Alemanha), Camille é médica e pesquisadora, dedicando-se, sobretudo, aos estudos sobre metabolismo ósseo e HR-pQCT. Em virtude de suas pesquisas, Camille foi congratulada com quatro prêmios, dentre eles, atribuídos pela Sociedade Brasileira de Densitometria Óssea, juntamente com outros pesquisadores: “Prêmio Antônio Carlos Araújo de Souza em Densitometria Clínica” (2008) e “III Prêmio de Incentivo à Pesquisa em Osteoporose e Osteometabolismo” (2011).

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