Aulas presenciais, eis a questão

Crianças aprendem rápido. E nós, adultos?

Para ler ouvindo: Metamorfose Ambulante de Raul Seixas

 

Nem bem a tão esperada chegada da vacina nos trouxe esperança, motivação e força a incompetência diplomática chegou pulando com os dois pés em nossos peitos emocionados. Ao invés da queda que tanto sonhamos, fomos nós que tropeçamos e seguimos juntando os cacos que se quebram e se esparramam a cada atualização das notícias. Apesar dos esforços de cientistas do mundo todo – os quais reverencio -, em terras tupiniquins o tal dia D e hora H se resumem a um sonoro: Drama Habitual. Não precisa dispor de nenhum poder para prever que a vacinação não só será a passos de tartaruga, como enfrentará batalhas épicas para existir por aqui. No entanto, sigo no anseio completo de que tudo mude e melhore.

Embora as evidências mostrem que as crianças não desempenham um papel importante na transmissão do coronavírus, confesso que sou o perfil de mãe que se apega aos poucos, mas reais, relatos de casos graves de Covid em menores de idade, especialmente até os 10 anos. Os atendimentos médicos infantis envolvendo complicações do vírus, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), deixou as famílias em alerta.  Obviamente que a taxa de mortalidade é quase insignificante (estatisticamente falando, é claro) perto da quantidade de vidas adultas que foram ceifadas, muitas precocemente, mas nem tais dados consultados em fontes oficiais são capazes de desfazer este nó que mora na minha garganta e pulsa toda vez que se fala em volta às aulas.

Desde o início dessa história toda, nunca consegui ver os pequenos como vilões – mesmo eles sendo capazes de levarem lápis, borrachas e os mais variados objetos à boca, incluindo as próprias mãos segundos depois de terem rastejado pelo chão. Mas, se dependemos que toda uma comunidade esteja envolvida e engajada na causa para que a rotina escolar possa ser retomada em segurança, mesmo que gradualmente e com muita parcimônia, isso sim me causa desespero. Não preciso do meu lado C.S.I. para investigar quem do meu círculo social é incapaz de seguir normas básicas de convivência impostas pela pandemia. As postagens pipocam aos montes na timeline, num misto de quero ter cuidado com preciso de praia, restaurante, festa e, ironicamente, ar fresco.

Só que tais escapadas, justificadas pelo tédio e cansaço, nos mantém agarrados à bandeira laranja, de alerta médio. Em Curitiba, onde moramos, são muitos novos casos e mortes diárias, taxa de ocupação de UTIs em alta, distanciamento cada vez menor, pessoas se atrevendo a andarem na rua sem máscara. Se no underground a capital do estado ostenta o adjetivo de provinciana, atualmente paira um certo clima de normalidade sobre aqueles que não viram nenhuma desgraça cair com exatidão sobre a cabeça ou o pulmão querido mais próximo – é o novo demodê dos curitibanos. Tais circunstâncias passam obrigatoriamente pela mente materna, em alguns momentos como um trailer de filme de terror de quinta.

Não é só currículo

Vamos fazer uma conta simples: mês que vem, quando estão marcados os retornos de boa parte dos estudantes, nem crianças, nem professores e funcionários (muitos do grupo de risco) estarão vacinados. Honestamente, pergunto: o que mudou de fato até aqui que justifique a retomada presencial? Creio que muito pouco, o suficiente para que eu decida por prosseguir com o acompanhamento on-line – o que, felizmente, estamos tendo estrutura e acesso. Foram necessárias muitas adaptações e investimentos para que hoje eu possa dizer que dispomos de um ambiente em casa totalmente dedicado aos estudos. Por essas e outras, não digo que sou contra as aulas presenciais, só que odiaria vê-las acontecer indiscriminadamente (o que, em se tratando de rede pública de ensino e a julgar pelo recente não adiamento do ENEM  são quase sinônimos).

Ir para aula é muito mais que estudar, envolve deslocamentos, trocas constantes, necessidades. Para me sentir minimamente confortável com a ideia, só se professores fossem considerados prioritários na campanha de vacinação e caso tivéssemos absoluta certeza da readequação das escolas e cumprimento rígido dos protocolos. Tudo isso, claro, priorizando o retorno de quem realmente mais precisa. Se estamos discutindo isso com familiares, pais e responsáveis, pediatras e amigos nas redes sociais, igualmente não se pode dizer da esfera governamental, que acha razoável comprar toneladas de álcool em gel e sabonetes sem melhorar instalações, capacidade de ocupação e, principalmente, ventilação. Não há um planejamento claro e muito menos voltado a quem mais sofreu por causa da pandemia e isso é de cortar o coração. Será que ainda podemos sonhar com equidade?

Atenta aos sinais

Se estou com o emocional abalado, o que dizer do meu menino sadio e sapeca no auge dos seus quase 7 aninhos. Sem amiguinhos do colégio, a entrada repleta de saudações vibrantes (como se nem tivessem se visto no dia anterior), aulas, profes, brincadeiras no pátio, no corredor, idas à biblioteca. É tanta coisa que constitui uma escola que faltaria espaço para descrever legitimamente. Dois anos quando já se tem 30, 40 anos é uma coisa. Para os pequenos, quase um universo inteiro. Como eu poderia ser contra algo que alimenta o intelecto e a alma do meu filho? Porém, atenta, vigilante e amorosa, mantenho meu compromisso comunitário: nenhum de nós estará bem até que todos estejam. Com meus braços abertos, acolho e dou colo a quem um dia se lembrará de ter vivido ao lado de quem mais o ama e escolheu fazer o certo por mais difícil que seja. Por enquanto, é vida escolar que segue virtualmente.

Até a próxima! 

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