Questão de Repúdio
Para ler ouvindo: AmarElo – Emicida (Sample: Belchior – Sujeito de Sorte) part. Majur e Pabllo Vittar
– Realmente foi minha culpa?
Perguntou a Minissaia.
– Não, também aconteceu comigo!
Replicou a Burka.
Enquanto isso…
A Fralda não disse nada, pois não sabia falar.
Autor(a) desconhecido(a)
Como se não bastasse minha aversão a quase todo discurso disfuncional e ao saudosismo tóxico que insiste em berrar nas redes sociais, há o fato de que estupro culposo não existe.
Há quem ainda, em pleno 2020, ignore evidências científicas insistindo que o aquecimento global é uma farsa, no entanto, estupro culposo é o que realmente não existe.
Muita gente nem sabe, então antes de negar a Teoria da Evolução é crucial trocar o “viemos dos macacos” por “compartilhamos um ancestral comum com eles”, tendo em mente, é claro, de que estupro culposo não existe.
Enquanto a crise de confiança na ciência leva pais a negarem aos filhos vacinas de doenças que por causa delas já haviam sido erradicadas, terapias sem eficácia comprovada são vendidas por altas cifras prometendo curas milagrosas e picaretas formulam qualquer teoria furada com fins motivacionais e faturam milhões. A nós, hoje, resta afirmar que estupro culposo não existe.
Extremistas de todos os espectros políticos e imagináveis não possuem mais um pingo de vergonha ao se assumirem negacionistas, contudo, mesmo nesse emanharado ignóbil teve quem postasse que estupro culposo não existe.
Muitas visões de mundo diferentes se uniram esta semana para dizer o óbvio, que estupro culposo não existe. Até Winston Smith, de “1984”, que foi torturado por agentes do regime totalitário até se convencer de que 2 + 2 é igual a 5 estaria dizendo: estupro culposo não existe.
Toda vez que achismos são colocados sobre a mesa para tratar de questões envolvendo a ciência e a ética, em detrimento da razão, vemos nossa dignidade ir pelo ralo na mesma medida em que a qualidade de vida se deteriora sob nossos olhos. Como se não bastasse, é preciso lembrar quem deveria saber de cor que estupro culposo não existe.
Se atualmente o repertório pessoal de alguém – ou o quanto ela jogou bets na rua, apanhou de chinelo e se autoconsidera normal – tem determinado não só o lixo que é publicado nas timelines da vida como também o futuro da nação, no viés confortável da confirmação das minhas crenças neste momento só ouço a voz que diz, categoricamente, que estupro culposo não existe.
Tem dias em que o nó na garganta é inevitável, mas em todos estupro culposo não existe. Independentemente da bolha egocêntrica na qual nos encontramos, da era dos fatos vs. convicções, da amnésia quase coletiva de como é ser civilizado, mesmo que no mundo virtual… ESTUPRO CULPOSO NÃO EXISTE.
Até a próxima!