Por que ainda sofremos tanto por amor na era dos relacionamentos líquidos?
Uma reflexão psicanalítica sobre os desafios do amor, da sexualidade e seus impactos na saúde mental contemporânea
De acordo com a pesquisa Love Life Satisfaction (Satisfação com a vida amorosa), divulgada em 2025 pela Ipsos, os brasileiros são os menos satisfeitos com a vida amorosa dentre os países latino-americanos que participaram da pesquisa, como México, Chile, Peru e Argentina.
No livro, discutimos o amor, um dos maiores motivos de busca por análise. Muitos dizem não querer saber dele. É moderno hoje querer independência e não “precisar” do amor. Amar gera sofrimento. Dá trabalho. Demanda esforço. Mas, quem sente, não abre mão, seja na maternidade, na relação com amigos, no trabalho, nos relacionamentos. Estar apaixonado e correspondido, não tem preço.
O amor, em suas múltiplas formas, continua sendo uma das principais causas que levam as pessoas à análise clínica. Vivemos em uma época que valoriza a autonomia emocional, mas o sofrimento amoroso persiste — seja nos vínculos familiares, nas relações de amizade, no ambiente de trabalho ou no amor romântico.
Quais os desafios dos relacionamentos em 2025?
Exploro as complexidades do amor e da sexualidade na contemporaneidade, convidando leitores a refletir sobre suas próprias experiências, passando por temas como relacionamentos abertos ou fechados, o impacto dos aplicativos de relacionamento, a origem e o manejo de conflitos, e a intervenção do amor e da sexualidade na saúde mental, tudo sob a ótica dos conceitos psicanalíticos de Freud e Lacan.
Freud constrói sua teoria psicanalítica com base na sexualidade humana e nos laços afetivos, fundamentais para a construção do aparelho psíquico, da noção de “eu”, da montagem narcísica. Ou seja, a nossa relação com o amor passa pelo histórico de vida, dores e frustrações não cicatrizadas, expectativas e sonhos a serem realizados. Um exemplo disso é o contraste entre o passado e o presente quando o assunto é o amor.
Criticam tanto outros séculos com casamentos arranjados em laços políticos e sociais hipócritas, e neste, que temos independência financeira e liberdade de escolha, por que não construir vínculos que venham do coração?
Dados do IBGE de 2023 apontam que 940 mil casamentos foram registrados no Brasil, um aumento de 3% em comparação com o ano anterior, enquanto as separações aumentaram 5%, totalizando 440 mil divórcios.
Esse comportamento em massa que muitos seguem pelo Amor Livre sem crítica ou reflexões mais profundas não seria uma forma de alienação para não enfrentar as emoções e compactuar com uma sociedade do excesso, da apatia emocional e da busca pela diversão contínua?
A obra se aprofunda nos desafios atuais do amor, listando mais de dez motivos pelos quais as pessoas enfrentam dificuldades nos relacionamentos, incluindo o narcisismo, o imaginário exacerbado, a expectativa do “conto de fadas”, as satisfações efêmeras e o sexo fácil, a queda do patriarcado e a “guerra dos sexos”.
Essas questões revelam que, apesar da liberdade e das transformações sociais, o amor continua sendo um terreno complexo e fonte de sofrimento. A busca por vínculos autênticos e profundos permanece, mas esbarra em expectativas idealizadas e em um contexto cultural que muitas vezes promove a superficialidade e a evasão emocional.
Assim, o sofrimento por amor não é apenas uma questão individual, mas um fenômeno que reflete as tensões e contradições da sociedade contemporânea, exigindo uma reflexão mais profunda sobre como nos relacionamos conosco e com os outros.
Por Fabiana Ratti
Psicóloga, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-SP, psicanalista com formação pelo IPP – Instituto de Pesquisa em Psicanálise, mais de 25 anos de experiência clínica, autora de livros e coleções sobre psicanálise, diretora da Clínica de Psicanálise Unbewusste e da Editora Unbewusste Ltda, professora, palestrante e supervisora clínica.
Artigo de opinião