Nova lei aumenta penas para quem fornece drogas ou álcool a menores, mas peca na precisão legal

Apesar do avanço na proteção de crianças e adolescentes, a legislação apresenta falhas que podem comprometer sua eficácia e segurança jurídica

Em meio à crescente preocupação com casos de bebidas alcoólicas adulteradas com metanol, foi sancionada a lei 15.234, que endurece as penas para quem fornecer drogas ou bebidas alcoólicas para crianças ou adolescentes até 18 anos. A nova legislação, publicada no Diário Oficial da União, foi aprovada pelas Comissões de Direitos Humanos e de Constituição e Justiça do Senado, refletindo um esforço legislativo para ampliar a proteção dos jovens contra substâncias nocivas.

Antes da alteração, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já previa pena de dois a quatro anos de detenção e multa para quem entregasse tais produtos a menores. Contudo, a pena era a mesma independentemente de o menor ter consumido ou não a substância. A nova lei introduz uma causa de aumento da pena, que pode variar de um terço até a metade, nos casos em que a criança ou adolescente efetivamente consome o produto.

O objetivo declarado da alteração é aumentar a proteção de crianças e adolescentes contra os efeitos nocivos do álcool e de outras substâncias que causam dependência. No entanto, essa medida revela mais uma iniciativa de caráter punitivista, que pouco contribui para o enfrentamento efetivo do consumo de bebidas alcoólicas por menores no Brasil. A ênfase na punição, embora necessária, não substitui políticas públicas de prevenção, educação e tratamento que são fundamentais para combater o problema de forma abrangente.

Outro ponto preocupante da nova lei é que o tipo penal não se restringe à entrega de bebidas alcoólicas, mas abrange também “outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica”. Essa formulação é excessivamente ampla, pois diversos medicamentos ou até alimentos lícitos podem conter substâncias com potencial de causar algum grau de dependência. A falta de precisão normativa evidencia uma inadequação da norma incriminadora diante de princípios basilares do Direito Penal, como o da taxatividade, que exige clareza e precisão na definição dos crimes.

O legislador poderia ter aproveitado a oportunidade para corrigir essa falha redacional, delimitando com mais rigor quais substâncias estariam sujeitas à penalização, evitando assim interpretações arbitrárias e insegurança jurídica. A ausência dessa delimitação pode gerar problemas práticos na aplicação da lei, além de abrir espaço para questionamentos judiciais.

Em suma, embora a nova lei represente um avanço na proteção legal de crianças e adolescentes contra o consumo de álcool e drogas, sua eficácia pode ser comprometida pela abordagem excessivamente punitiva e pela imprecisão na definição do tipo penal. Para que a legislação cumpra seu papel de forma efetiva, é fundamental que seja acompanhada de políticas públicas integradas e que o texto legal seja aprimorado para garantir segurança jurídica e justiça na aplicação das penas.

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Por Juliano Callegari Melchiori

advogado criminalista, mestrando em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), especialista em Processo Penal pela Universidade de Coimbra/IBCCRIM

Artigo de opinião

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