Cannabis Medicinal no Autismo Infantil: Seis Pontos Essenciais para Entender seu Uso
No Dia do Orgulho Autista, uma análise sobre os desafios, benefícios e preconceitos do tratamento com cannabis para crianças no espectro autista
Criado em 2005 para combater preconceitos e estigmas acerca do espectro autista, o Dia do Orgulho Autista é celebrado em todo o mundo por quem procura valorizar a neurodiversidade e incentivar políticas de inclusão. Trata-se de uma ótima oportunidade para combater o desconhecimento com informação e ciência. É um absurdo sem tamanho o médico causar dano para seu paciente por não estar informado sobre uma estratégia terapêutica. Cannabis medicinal é simplesmente isso: uma estratégia terapêutica.
Para entender os ótimos resultados de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em tratamentos à base de cannabis medicinal, é fundamental compreender o funcionamento do Sistema Endocanabinoide (SEC), um complexo sistema biológico presente em todos os seres humanos, responsável por regular funções essenciais como sono, apetite, dor, humor e resposta imunológica. Tratar o SEC é tratar o autismo, e não apenas os sintomas do autismo. Podemos avaliar a eficácia do tratamento pela redução da escala de gravidade e pelos relatos das pessoas envolvidas na vida dos pacientes.
O primeiro passo para quem busca tratamento com cannabis medicinal é procurar médicos que sejam prescritores da substância, evitando profissionais retrógrados. Indicações, pesquisas nas redes sociais e associações de médicos prescritores são caminhos importantes para encontrar o especialista adequado.
A decisão de iniciar o tratamento com cannabis geralmente ocorre após diversas tentativas frustradas com outras drogas, especialmente em casos graves como epilepsia, transtornos do sono e atraso global do desenvolvimento, que respondem pouco ou nada às medicações convencionais. No TEA, há uma tendência à hipermedicalização com muitos efeitos adversos, o que leva famílias bem informadas a buscar alternativas inovadoras que possam melhorar o prognóstico. Muitas vezes, a iniciativa parte dos próprios pacientes ou familiares, o que estimula o médico a estudar e pesquisar para oferecer o melhor tratamento.
Os sinais de que o tratamento está funcionando incluem métodos científicos, como a redução da escala de gravidade, e relatos qualitativos: a criança fica mais calma, concentrada, dorme melhor, comunica-se e socializa mais. Esses avanços podem ser observados por familiares, terapeutas, escola e, conforme a criança ganha autonomia, por ela mesma.
Para não sobrecarregar a mãe no processo, é fundamental envolver outros membros da família, cuidadores e terapeutas, compartilhando responsabilidades. Explicar todas as opções terapêuticas possíveis, seus efeitos esperados e adversos, ajuda a família a tomar decisões confortáveis e centradas no melhor para o paciente.
Um estudo recente chamou atenção ao medir a anandamida no cordão umbilical — um endocanabinoide produzido naturalmente pelo corpo que atua nos receptores do SEC. Recém-nascidos que posteriormente são diagnosticados com autismo apresentaram baixos níveis dessa substância no cordão umbilical, indicando que a condição pode se desenvolver já no útero. O TEA não é apenas uma questão comportamental, mas um problema global das conexões cerebrais. Dispor de recursos terapêuticos para tratar a causa, combatendo a baixa anandamida com canabidiol, é algo espetacular. A literatura indica que o uso é seguro em crianças a partir de dois anos, e pesquisas futuras poderão ampliar seu uso para neonatais.
O preconceito em relação ao tratamento com cannabis medicinal decorre principalmente da desinformação. Muitos associam o uso à droga recreativa, temendo prejuízos, quando na verdade trata-se de uma estratégia terapêutica para uma causa biológica do autismo. Familiares frequentemente consultam médicos que desconhecem o SEC e mantêm preconceitos baseados no medo do THC ou na ideia equivocada de fazer apologia às drogas. É um absurdo causar dano ao paciente por falta de informação. Quanto mais se estuda, mais se deslumbra com o potencial da cannabis medicinal. O SEC no TEA é um sistema que não funciona adequadamente. Tratar o SEC é tratar o autismo, e não apenas seus sintomas.
Por Dra. Fernanda Moro
neuropediatra especialista em cannabis medicinal
Artigo de opinião