Entendendo o Uso da Cannabis Medicinal no Tratamento do Autismo Infantil
Como a ciência e o sistema endocanabinoide abrem novas possibilidades terapêuticas para crianças com TEA
No Dia de Orgulho Autista, celebrado em 18 de junho, é importante destacar os desafios enfrentados pelas famílias até a escolha por um tratamento à base de cannabis. Segundo a neuropediatra especialista em cannabis medicinal, Dra. Fernanda Moro, “você quer empoderar seu filho, não dopá-lo”.
Criado em 2005 para combater preconceitos e estigmas acerca do espectro autista, o Dia do Orgulho Autista valoriza a neurodiversidade e incentiva políticas de inclusão. “É uma ótima oportunidade para combater o desconhecimento com informação e ciência”, afirma a especialista. Ela ressalta que é um absurdo causar dano ao paciente por falta de informação sobre estratégias terapêuticas, e que a cannabis medicinal deve ser vista exatamente como isso: uma estratégia terapêutica.
A compreensão do Sistema Endocanabinoide (SEC) — um complexo sistema biológico presente em todos os seres humanos que regula funções essenciais como sono, apetite, dor, humor e resposta imunológica — é fundamental para entender os bons resultados observados em crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) tratadas com cannabis medicinal. “Tratar o SEC é tratar o autismo, e não apenas os sintomas. Avaliamos o sucesso do tratamento pela redução da escala de gravidade e pelos relatos de quem convive com a criança”, explica.
Dra. Fernanda Moro destaca alguns pontos importantes para quem considera o tratamento:
1. Primeiro passo: Buscar médicos que prescrevem cannabis medicinal, evitando profissionais retrógrados. Indicações, redes sociais e associações de prescritores são bons caminhos para encontrar o especialista adequado.
2. Momento da decisão: Geralmente, a escolha pela cannabis vem após tentativas frustradas com outras medicações, especialmente em casos graves como epilepsia, transtornos do sono e atrasos globais do desenvolvimento. No TEA, a hipermedicalização e seus efeitos adversos levam famílias bem informadas a buscar alternativas inovadoras que possam melhorar o prognóstico. Muitas vezes, a demanda parte dos próprios pacientes e familiares, incentivando os médicos a estudarem o tema.
3. Sinais de eficácia: A avaliação científica pela redução da escala de gravidade é combinada com relatos da família, escola, terapeutas e, quando possível, da própria criança. Melhoras na calma, concentração, sono, comunicação e socialização são indicadores claros de progresso.
4. Apoio à família: Para não sobrecarregar a mãe, é fundamental envolver outros membros da família, cuidadores e terapeutas no processo, compartilhando responsabilidades e apresentando todas as opções terapêuticas para que a decisão seja confortável e centrada no melhor para o paciente.
5. Estudos recentes: Um estudo que mediu a anandamida — um endocanabinoide produzido naturalmente pelo corpo — no cordão umbilical chamou atenção. Recém-nascidos que posteriormente foram diagnosticados com autismo apresentaram baixos níveis dessa substância, indicando que o TEA tem origem já no desenvolvimento fetal. Isso reforça que o autismo não é apenas um transtorno comportamental, mas um problema global das conexões cerebrais. O uso do canabidiol para combater a baixa anandamida é um recurso terapêutico promissor e seguro para crianças a partir de dois anos, com potencial para uso neonatal em pesquisas futuras.
6. Origem do preconceito: A desinformação e o medo do THC (tetrahidrocanabinol) alimentam o preconceito contra o uso da cannabis medicinal. Muitas vezes, familiares consultam médicos que desconhecem o SEC e têm receios infundados, confundindo tratamento com uso recreativo de drogas. Dra. Fernanda Moro enfatiza que é um absurdo causar dano ao paciente por falta de conhecimento sobre essa estratégia terapêutica. Quanto mais se estuda o SEC no TEA, mais se reconhece seu potencial. Tratar o SEC é tratar a causa do autismo, não apenas seus sintomas.
O avanço no entendimento do sistema endocanabinoide e a aplicação da cannabis medicinal representam uma nova fronteira no tratamento do autismo infantil, oferecendo esperança e qualidade de vida para muitas famílias.
Por Dra. Fernanda Moro
neuropediatra especialista em cannabis medicinal
Artigo de opinião