Parkinson: além do tremor, a urgência de uma abordagem multidimensional e inclusiva

Compreender os sintomas não motores e os desafios estruturais é essencial para melhorar a qualidade de vida dos pacientes com Parkinson

O Parkinson é amplamente associado ao tremor, mas há outros sintomas que ultrapassam os distúrbios motores e impactam significativamente a qualidade de vida dos pacientes: fadiga intensa, dores crônicas, alterações cognitivas, dificuldades emocionais e alterações autonômicas podem estar associadas à doença, mas são frequentemente subestimadas pelos profissionais da saúde e pela sociedade, embora representem um comprometimento na autoestima e autonomia dos pacientes.

Sintomas como constipação intestinal, quedas de pressão, dificuldades de fala e problemas posturais muitas vezes passam despercebidos ou são confundidos com outras condições, retardando um diagnóstico preciso. A avaliação clínica não deve se limitar aos sintomas motores, uma vez que os sinais não motores podem ser igualmente debilitantes. A identificação precoce e o tratamento adequado das manifestações não motoras são indispensáveis para o acompanhamento desses pacientes.

A doença afeta 1% da população mundial com mais de 65 anos. No Brasil, a estimativa é de que aproximadamente 200 mil pessoas vivam com a condição.

A progressão do Parkinson varia de paciente para paciente. Enquanto alguns permanecem estáveis por décadas, outros podem experimentar uma evolução acelerada. Pacientes mais jovens, na faixa dos 50 anos, costumam sofrer mais impacto na rotina, pois ainda estão no mercado de trabalho e enfrentam desafios como tremores em situações profissionais.

A perda da independência, a dificuldade em planejar viagens e a impossibilidade de realizar tarefas cotidianas podem gerar um forte impacto emocional. Não por acaso, depressão e ansiedade são frequentes entre os pacientes. Estima-se que cerca de 50% dos pacientes apresentem quadros de depressão e até 20% desenvolvam depressão severa.

Para garantir um atendimento eficaz, profissionais de múltiplas áreas da saúde devem adotar uma escuta ativa e promover um espaço onde os pacientes se sintam confortáveis para relatar as dificuldades. A empatia aliada a uma anamnese detalhada permite compreender melhor os impactos subjetivos da doença. Muitas vezes, o que mais aflige o paciente não é o tremor ou a rigidez, mas sim as limitações que afetam sua independência e bem-estar emocional. Compreender essa dimensão exige tempo e um acompanhamento mais próximo. Um tratamento eficiente deve ser multidisciplinar incluindo apoio psicológico, fisioterapia e fonoaudiologia quando necessário.

A falta de infraestrutura disponível para o tratamento é um dos grandes desafios no Brasil. Nos grandes centros urbanos, há hospitais de referência do SUS que oferecem com excelência o suporte necessário, mas, nas cidades menores, o acesso a profissionais capacitados e a terapias complementares, ou até mesmo cirurgias que poderiam beneficiar o indivíduo, ainda é extremamente limitado.

Além desta carência, a distribuição irregular de medicamentos prejudica consideravelmente o tratamento. O desabastecimento de medicamentos é um problema recorrente. Uma fiscalização mais rigorosa e um planejamento mais eficiente ajudariam a garantir a continuidade do tratamento.

A acessibilidade também representa um grande obstáculo. As leis sobre o tema ainda são falhas e, muitas vezes, não aplicadas. O simples ato de caminhar pelas ruas pode ser uma experiência desagradável para quem tem limitações motoras, devido às barreiras urbanísticas.

Por outro lado, há avanços, como a isenção do imposto de renda para aposentados e pensionistas diagnosticados com Parkinson — embora essa medida não contemple aqueles que ainda estão em atividade profissional.

Os impactos menos evidentes do Parkinson nem sempre são reconhecidos, tornando o diagnóstico e o tratamento mais complexos. Muitos pacientes enfrentam dificuldades para manter suas atividades laborais, seja por preconceito ou pela necessidade de adaptação às novas condições impostas pela doença. As famílias também sentem os reflexos da doença, e muitas vezes assumem o papel de cuidadoras sem o suporte adequado, o que gera sobrecarga emocional e financeira.

Se quisermos melhorar o suporte aos pacientes com Parkinson, precisamos ampliar nossa compreensão sobre a doença e reconhecer suas múltiplas dimensões. O manejo deve ir além do controle dos sintomas motores, promovendo o bem-estar geral do paciente e permitindo que ele continue participando ativamente da sociedade. Uma abordagem integrada e humanizada, políticas públicas abrangentes, ambientes de trabalho acessíveis e fomento às iniciativas que permitam a inclusão dos pacientes na vida social e profissional são fundamentais para essa doença.

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Por Dr. Marcelo Valadares

Médico neurocirurgião, pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), especialista em Neurocirurgia Funcional, fundador e diretor do Grupo de Tratamento de Dor de Campinas, responsável pela recriação da divisão de Neurocirurgia Funcional da Unicamp e implantação da cirurgia DBS na instituição.

Artigo de opinião

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