O amor na era da desconexão: por que os apps de namoro perdem espaço para as agências de relacionamento

Desgaste emocional e superficialidade dos aplicativos digitais levam jovens a buscar conexões mais profundas e personalizadas por meio de serviços especializados

Por quase uma década, os aplicativos de namoro dominaram a cena dos relacionamentos. O que parecia ser uma revolução no amor — com a promessa de múltiplas opções, facilidade de acesso e compatibilidade imediata — está, aos poucos, dando lugar ao descontentamento. As estatísticas mostram desaceleração no número de usuários ativos, especialmente entre adultos que buscam relacionamentos mais consistentes.

A causa não é difícil de entender: o ambiente desses apps se tornou desgastante. Muitos usuários descrevem um ciclo repetitivo de conversas que não avançam, interações vazias, promessas não cumpridas, interesse apenas sexual e o famoso ghosting. Em vez de facilitar conexões, os aplicativos criaram uma experiência emocionalmente cansativa, superficial e, muitas vezes, desumanizante.

O excesso de opções, inicialmente visto como um atrativo, revelou seu lado tóxico. Com tantas possibilidades, as relações tornaram-se descartáveis: é o paradoxo da escolha — teoria do psicólogo estadunidense Barry Schwartz — onde quanto mais opções temos, mais difícil é escolher e mais infelizes ficamos com a escolha feita. Um pequeno incômodo já basta para partir em busca de uma “versão melhor” a um deslizar de dedo.

Essa lógica, importada do consumo digital, invadiu o campo afetivo. E o resultado? Relações frágeis, vínculos rasos e uma sensação generalizada de frustração e solidão: em todas as eras essa tem sido uma das mais solitárias, sendo considerada pandêmica desde 2023 pela Organização Mundial da Saúde.

Além disso, os algoritmos desses aplicativos operam com critérios limitados e, muitas vezes, enviesados. Baseiam-se em aparência, localização, tempo de resposta e curtidas anteriores, mas ignoram aspectos profundos como história de vida, valores, maturidade emocional, traumas passados, desejos futuros e linguagem afetiva. A consequência é uma incompatibilidade de base, disfarçada por afinidades superficiais.

Diante desse cenário, cresce um movimento silencioso e promissor: o retorno à personalização nas relações. Serviços de matchmaking — as antigas agências ou agentes de relacionamento — antes associados a práticas antiquadas, voltaram com força, só que repaginados com suporte psicológico, tecnologia de dados e foco em relações duradouras.

Nesses serviços, tudo começa com uma escuta ativa e aprofundada. O cliente passa por entrevistas detalhadas com profissionais especializados, que analisam sua história afetiva, crenças, objetivos de vida e perfil psicológico. Em seguida, é feito um mapeamento cuidadoso para identificar pessoas compatíveis não apenas em gostos, mas em visão de mundo, estilo de vida, planos de futuro e maturidade relacional.

Alguns desses serviços incluem coaching emocional, acompanhamento individual, apoio na comunicação interpessoal e orientação para evitar padrões repetitivos de autossabotagem. Há, inclusive, quem combine matchmaking com atendimento terapêutico, ajudando o cliente a se fortalecer emocionalmente antes de iniciar um novo relacionamento. Os encontros propostos são selecionados com sigilo, respeito e, principalmente, intenção real de conexão.

Esse tipo de abordagem tem atraído especialmente pessoas acima dos 30 anos, profissionais ocupados, divorciados e aqueles que já passaram pelas decepções dos aplicativos e não querem mais “jogar o jogo” afetivo. São homens e mulheres que valorizam o tempo, a privacidade e a profundidade — e que compreendem que um relacionamento saudável começa com escolhas mais conscientes.

É verdade que a tecnologia facilitou muitos encontros. Mas talvez agora estejamos redescobrindo que amar exige mais do que algoritmos e matchs. Exige presença, escuta, conexão humana e cuidado. E isso, até segunda ordem, ainda é melhor feito por humanos — e não por máquinas.

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Por Relly Amaral Ribeiro

assistente social, professora e mediadora acadêmica dos cursos de pós-graduação da área social da UNINTER

Artigo de opinião

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