Embriões congelados por décadas: o que a ciência revela sobre sua viabilidade e os dilemas éticos envolvidos
O nascimento de um bebê a partir de um embrião congelado há 31 anos reacende debates sobre tecnologia, longevidade embrionária e desafios éticos na reprodução assistida
O nascimento de Thaddeus, nos Estados Unidos, a partir de um embrião congelado por 31 anos, voltou a chamar a atenção para um ponto que sempre suscita dúvidas na reprodução assistida: por quanto tempo um embrião pode permanecer congelado sem perder viabilidade? A resposta científica é mais simples do que parece, e o caso revela justamente isso.
Enquanto sua irmã biológica nasceu nos anos 1990, o embrião que deu origem a Thaddeus permaneceu por três décadas em nitrogênio líquido a cerca de –196°C. Ainda assim, gerou uma gestação saudável. Para os médicos, o número de anos tem um impacto muito menor do que as pessoas imaginam.
“O embrião não envelhece. A partir do momento em que entra em nitrogênio líquido, seu metabolismo é interrompido de forma praticamente completa. Ele permanece como estava no dia do congelamento”, explica o Dr. Edson Borges Jr., Diretor Científico do FertGroup.
Mais do que a “idade”, o fator determinante é a tecnologia usada no congelamento. Nos anos 1990, o método predominante era o congelamento lento, que expunha o embrião ao risco de formação de cristais de gelo capazes de danificar suas células no momento do descongelamento. Isso reduzia as chances de sobrevivência, mas não as anulava, como comprova o caso recente.
“Quando falamos de embriões congelados há décadas, a principal dúvida não é sobre o tempo, mas sobre a técnica utilizada naquela época. Hoje usamos a vitrificação, que retira água rapidamente das células e impede a formação de gelo, aumentando muito a taxa de sobrevivência”, detalha o especialista.
Além da curiosidade científica, casos como o de Thaddeus colocam luz sobre um fenômeno crescente: o acúmulo de embriões criopreservados ao redor do mundo. Só nos Estados Unidos, estima-se mais de 1,5 milhão em armazenamento.
O motivo é multifatorial: famílias que completam seu planejamento reprodutivo e não sabem o que fazer com os embriões excedentes, dificuldades legais para descarte, diferenças na legislação entre países e até a falta de informação sobre alternativas, como doação para outros casais.
“O acúmulo de embriões é um desafio global. Muitos países não têm normas claras sobre destino, descarte, doação ou tempo máximo de armazenamento. A ciência avançou mais rápido do que o debate ético e legal”, avalia Borges. “É fundamental orientar os pacientes desde o início, para que entendam todas as implicações de criar e manter embriões congelados.”
A adoção embrionária, como ocorreu no caso norte-americano, ainda é rara no Brasil, mas cresce lentamente, especialmente entre casais que desejam gestar, mas não têm gametas viáveis ou preferem uma alternativa à adoção tradicional.
Para além das manchetes, o episódio reforça um ponto crucial para quem considera preservar a fertilidade: “O sucesso de um embrião não depende dos anos congelado, mas da qualidade dos gametas e, consequentemente dos embriões, no momento da coleta. Por isso, mulheres que congelam óvulos mais jovens têm melhores chances futuras, mesmo que esses óvulos sejam utilizados décadas depois”, explica o especialista.
Os avanços tecnológicos também indicam que embriões criados hoje têm potencial de permanecer viáveis por tempo indefinido, ampliando as possibilidades de planejamento reprodutivo e oferecendo às famílias mais tempo para decidir seus caminhos.
“A criopreservação é uma ferramenta poderosa. Mas, como toda tecnologia que toca a vida humana, precisa ser acompanhada por informação clara, responsabilidade e reflexão ética”, conclui o Dr. Edson Borges Jr.
Por Edson Borges Jr.
Diretor Científico do FertGroup
Artigo de opinião



