Tremembé: A Comunicação como Ferramenta de Poder e Transformação no Sistema Prisional
A série que revela como a palavra pode libertar ou aprisionar, espelhando a sociedade e desafiando nossa percepção sobre crime, culpa e recomeço
A série Tremembé, produção do Prime Video, direciona o olhar para um dos presídios mais conhecidos do país e seus moradores famosos: pessoas que cometeram crimes com forte repercussão e agora compartilham o mesmo espaço entre alianças, sabotagens e estratégias de manipulação. Ao expor o cotidiano desses detentos, a produção reacende um debate sensível sobre até que ponto a representação de criminosos na tela se aproxima de uma romantização do crime ou de um exercício necessário de humanização.
A série ultrapassa o campo do sensacionalismo e propõe uma discussão mais profunda sobre o poder da linguagem. Dentro do cárcere, a fala assume outro significado. “Dentro de uma penitenciária, a comunicação persuasiva deixa de ser apenas uma habilidade e se torna uma questão de sobrevivência. Manipular, convencer e negociar são estratégias de quem precisa se proteger, garantir influência e manter algum controle sobre um ambiente de vulnerabilidade constante.”
Em Tremembé, a convivência entre criminosos de alta periculosidade revela que cada gesto, palavra ou silêncio carrega intenção e cálculo. Compreender essa dinâmica é essencial para não confundir empatia com indulgência. O poder da fala pode tanto reconstruir quanto destruir. A série mostra que, mesmo em meio à violência e ao isolamento, o ser humano continua tentando convencer, conquistar espaço e é nesse jogo de persuasão que se revelam as camadas mais complexas da natureza humana.
Mais do que retratar crimes ou criminosos, Tremembé propõe uma reflexão sobre culpa e recomeço. O incômodo causado por suas narrativas não é gratuito, ele revela uma sociedade cansada da situação de permanente insegurança, mas também o quanto ainda é preciso compreender sobre a condição humana e sobre a comunicação moldando comportamentos. “Somos todos maiores que os nossos erros”, frase que expressa responsabilidade e a capacidade de transformação que existe em cada um. Permanecer no erro é uma escolha, mas quando a sociedade reconhece e abre espaço para reconstruir, é aí que a mudança acontece.
Essa mensagem não nasceu em Tremembé, mas ecoa de experiências vividas dentro do sistema prisional, transformadas em reflexões sobre comunicação e perdão. O mesmo conceito que emociona plateias em palestras agora se reflete nas discussões que a série provoca diante da tela.
A série também provoca o público a refletir sobre a sociedade fora dos muros. Todos nós, em maior ou menor grau, usamos a persuasão nas relações cotidianas, seja em casa, no trabalho, na igreja ou na política. O que Tremembé faz é nos lembrar que o discurso, quando usado de forma estratégica, é também uma ferramenta de poder e de defesa. Entre as grades ou fora delas, quem domina a palavra, domina o próprio destino.
Por Cristian Magalhães
Especialista em comunicação intencional e oratória, advogado, mediador de conflitos judiciais pelo TJMG, experiência com população carcerária e pesquisas pela APAC, palestrante TEDx, reconhecido pela Jethro como Diplomata Civil Humanitário, formador em Direito pela Universidade Federal de Lavras, especialista em mediação de conflitos judiciais.
Artigo de opinião



