A urgência da representatividade feminina negra no STF
Como a ausência de mulheres negras na Suprema Corte perpetua exclusões históricas e limita a justiça no Brasil
A aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso no dia 18 de outubro reacendeu o debate sobre a necessidade de aumentar a presença feminina na mais alta instância do Judiciário brasileiro. Desde o anúncio da saída de Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF), movimentos populares e sociais intensificaram a pressão sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que, finalmente, a indicação contemple uma mulher negra.
“O Supremo Tribunal Federal deveria ser um espelho da sociedade brasileira. A população brasileira é composta, majoritariamente, por mulheres (51,5%) e negros (56%). No entanto, em mais de 130 anos de história, apenas três mulheres integraram a Corte, e nenhuma delas era uma mulher negra”, afirma a advogada criminalista Mariana Rieping.
Um século de exclusão feminina
A trajetória da presença feminina no STF revela o machismo estrutural enraizado na sociedade e no Judiciário brasileiro. A Corte aguardou 111 anos para ter sua primeira ministra: Ellen Gracie Northfleet, nomeada em 2000. Posteriormente, vieram Cármen Lúcia (2006) e Rosa Weber (2011). Com a aposentadoria de Rosa Weber em 2023, o tribunal retornou ao cenário de ter apenas uma ministra entre as onze cadeiras.
O STF julga os temas mais sensíveis para a sociedade e os direitos humanos, sendo a instância final em pautas de grande impacto, como a descriminalização do aborto, políticas raciais e proteção de minorias. A composição majoritariamente masculina suscita uma questão fundamental: o que esperar de um Judiciário onde dez homens brancos e apenas uma mulher decidem sobre direitos que afetam a maioria da população?
O impacto da sub-representação
A criminalista Mariana Rieping explica que, neste cenário, as decisões refletem uma perspectiva predominantemente masculina sobre questões que impactam de forma mais intensa mulheres e negros. “A presença feminina, com suas experiências e diferentes visões, enriquece o debate constitucional e aproxima o tribunal da sociedade que ele precisa representar.”
Segundo Rieping, a principal consequência dessa falta de diversidade é a limitação das diferentes perspectivas. “O principal impacto negativo é a naturalização dessa visão masculina como se fosse a única possível. Quando temos mulheres participando das decisões, o debate se torna mais amplo, mais realista e mais próximo das experiências da maioria da população”, explica. A advogada enfatiza que a presença de ministras é ainda mais vital em casos envolvendo autonomia reprodutiva, violência de gênero e políticas públicas de igualdade.
Uma estrutura historicamente excludente
A ausência de mulheres no STF é sintoma da carência crônica de presença feminina nos espaços de poder. Essa disparidade, segundo a especialista em direitos das mulheres, resulta diretamente de uma sociedade ainda profundamente patriarcal.
“Os homens são beneficiários da maior política afirmativa da história. A falta de representatividade de gênero no STF não é coincidência, é resultado de uma estrutura social que sempre privilegiou o olhar masculino”, explica a advogada.
Segundo Mariana Rieping, incluir mais mulheres nas instituições de justiça e em posições de poder é fundamental para fortalecer a democracia e garantir que as decisões judiciais contemplem todas as perspectivas sociais. “A inclusão de mais mulheres na Suprema Corte seria um avanço civilizatório. É sobre democratizar o olhar jurídico e reconhecer que a diversidade fortalece o Estado de Direito”, conclui.
Por Camila Oliveira
Artigo de opinião



