Vigilância Corporativa e Saúde Mental: O Desafio da Cultura de Confiança no Itaú
Entre o monitoramento digital e a pressão por resultados, como a superexposição no ambiente de trabalho impacta o bem-estar dos colaboradores?
O recente caso envolvendo monitoramento digital de colaboradores do Itaú reacendeu uma discussão cada vez mais presente nas empresas: quais são os limites da vigilância corporativa e até que ponto ela afeta a saúde mental dos trabalhadores? Se por um lado a tecnologia permite acompanhar entregas e medir produtividade em tempo real, por outro cria um ambiente de constante superexposição, semelhante ao que vemos em reality shows, onde cada gesto é analisado e qualquer deslize pode custar caro.
Uma pesquisa recente publicada pela Folha de S.Paulo mostra que, no caso do Itaú, o monitoramento vai além da simples contagem de horas, incluindo o rastreamento de cliques, abas abertas, uso de memória no computador, abertura de tickets e registros em sistemas internos. Esses dados, usados como base para decisões de desligamento, evidenciam o quanto a fiscalização pode se tornar invasiva quando não há transparência ou diálogo com os colaboradores.
Essa prática, ainda que respaldada por métricas de produtividade, potencializa o estresse, reforça a sensação de estar sob constante vigilância e compromete a confiança mútua entre empresa e trabalhador.
Essa dinâmica, marcada por microgestão e metas excessivas, tem gerado impactos emocionais profundos. Ansiedade, insegurança, medo de falhar e até burnout surgem quando o colaborador percebe que não há espaço para erros ou pausas legítimas. Assim como os participantes de um reality show vivem sob câmeras 24 horas, profissionais submetidos a ambientes de monitoramento intenso carregam o peso de um “olhar invisível”, que mina a autonomia e o engajamento no dia a dia.
Para Luciane Rabello, psicóloga, especialista em RH e CEO da TalentSphere People Solutions, é justamente a confiança que precisa ser resgatada. “Quando um colaborador sente que está sob vigilância constante, sua capacidade de criar e inovar diminui. A cultura de confiança precisa se sobrepor ao medo de estar sendo observado”, afirma. Segundo ela, soluções passam por mais transparência na forma como métricas são aplicadas, diálogo aberto entre gestores e equipes e incentivo à autonomia para que cada profissional possa gerenciar seu ritmo de trabalho de forma responsável.
Mais do que uma questão legal, trata-se de uma mudança cultural. Ambientes que priorizam confiança e autonomia tendem a ser mais sustentáveis no longo prazo, reduzindo turnover, fortalecendo o engajamento e preservando a saúde emocional dos colaboradores.
O caso do Itaú serve como alerta, mas não é isolado: em um mundo corporativo cada vez mais digital, as empresas precisam decidir se querem ser espaços de controle absoluto ou de desenvolvimento humano.
Por Luciane Rabello
Psicóloga, especialista em RH, CEO da TalentSphere People Solutions, docente, especialista em gestão de pessoas e multiculturalismo, com mais de 20 anos de atuação em gestão estratégica de pessoas em empresas globais como Red Bull, Adidas, Palfinger Group e Siemens Energy
Artigo de opinião