As múltiplas faces do amor na MPB sob o olhar da psicanálise
Como as letras e melodias da música popular brasileira revelam desejos, dores e plenitudes das relações amorosas
A música traduz emoções como poucas linguagens conseguem. A música popular brasileira (MPB) se apropria dos sentimentos presentes nos diversos tipos de trocas afetivas, explorando suas nuances psicológicas. Tanto a psicanálise quanto a MPB têm em comum o lugar central da palavra. A MPB faz da letra e do texto o elemento central da sua construção, diferentemente da canção erudita, por exemplo, em que às vezes você mal entende o que está sendo cantado, porque lá a técnica prevalece.
A MPB é responsável pela transmissão de alta poesia em forma musicável, o que a torna mais palatável ao público. Temos grandes poetas na MPB como Antônio Cícero, Waly Salomão, Chico Buarque e Vinicius de Moraes, que têm suas letras recebidas de forma mais prazerosa por conta da melodia. Também por ser um gênero musical que fala das questões mais subjetivas, obviamente muito marcada pela cultura e pelo sujeito, fala muito do amor.
As canções da MPB revelam a dificuldade de entender o objeto do nosso amor, que é um objeto inconsciente, que não dominamos — não sabemos se é a pessoa certa ou não. Em seguida, há canções que abordam o encontro pleno do amor, mostrando a vertente da plenitude que pretendemos alcançar, como a canção “É o amor”, de Zezé Di Camargo e Luciano.
Por outro lado, muitas canções populares mostram as mágoas que o amor pode causar, o quanto amar pode ser uma ilusão. “Pra quê rimar amor e dor?”, como Caetano sabiamente pergunta na música “Mora na Filosofia”. Existem muitas canções que fazem do amor o pior encontro que pode acontecer pela dor que ele é capaz de promover, como diz Lupicínio Rodrigues:
“Esses moços, pobres moços / Ah! Se soubessem o que eu sei / Não amavam, não passavam / Aquilo que já passei.”
Finalmente, há canções que mostram a percepção entre amor e futuro, como a ideia de que “qualquer tipo de amor vale a pena” — presente na canção “Paula e Bebeto”, de Milton Nascimento e Caetano Veloso — ou de que “todo amor é sagrado”, mostrando que o amor não necessariamente precisa ter um fim melancólico, mas também pode abrir espaço para outros amores.
Por Marcos Comaru
Psicanalista. Doutorado em Teoria Psicanalítica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2002). Experiência em Psicologia com ênfase em Tratamento e Prevenção Psicológica. Atua em Psicanálise, Neurose Obsessiva, Defesas.
Artigo de opinião