Registrar emoções para preservar a vida: a maternidade através da escrita no Setembro Amarelo
Como o ato de escrever cartas para os filhos transformou a dor, fortaleceu o amor e valorizou os pequenos momentos da vida materna
Comecei a escrever cartas para meus filhos no dia em que descobri que estava grávida pela primeira vez. Era um plano antigo, e sentir uma vida pulsando dentro de mim despertou a necessidade de registrar cada emoção, cada medo e cada descoberta. A escrita se tornou um exercício diário de atenção, amor e autoconhecimento, que me fez observar detalhes do cotidiano e perceber o valor dos pequenos gestos.
Escrever também se tornou uma forma de reconhecer minhas emoções e cuidar da minha saúde mental, mostrando que refletir sobre sentimentos faz parte de ser mãe e de se manter emocionalmente equilibrada — um cuidado que o Setembro Amarelo nos convida a reforçar.
Com o tempo, percebi que os problemas nem sempre são tão grandes quanto parecem e que a vida muda rapidamente. Nem sempre as histórias seguem o que planejei, e confiar no que acontece naturalmente trouxe uma leveza inesperada. Cada gesto, cada descoberta da infância ganhou um significado especial, e passei a valorizar as pequenas trocas de afeto que formam memórias duradouras.
Amor, luto e generosidade
Cada filho trouxe aprendizados diferentes. Igor, meu primeiro filho, faleceu pouco tempo após nascer, e escrever se tornou uma ferramenta essencial para lidar com a dor. A escrita me ajudou a transformar sentimentos de perda e tristeza em compreensão e esperança, lembrando que expressar emoções é vital para a saúde mental.
A palavra me mostrou seu poder de cura, capaz de transformar sentimentos e criar memórias. Quando Lucas e Luisa chegaram, cada um com suas particularidades, registrar suas descobertas me ensinou a enxergar cada instante de ternura com atenção e gratidão.
A escrita também me fez perceber minhas próprias falhas. Nem sempre consigo agir como imagino, mas buscar uma postura baseada em respeito e paciência permite manter um saldo positivo e mostrar aos filhos que reconhecer e corrigir erros também é um aprendizado.
O hábito de escrever, inicialmente pensado como um presente para meus filhos, transformou-se em livro. Ao longo de dez anos, reuni cerca de cem cartas que agora compartilho com outras famílias. Mesmo quem acha que não tem tempo ou talento pode começar a registrar sua história, porque essas lembranças preservam momentos que poderiam se perder e se tornam companhia ao longo da vida.
Uma maternidade feita de instantes
Escrever me ensinou que a maternidade é feita de instantes — alegrias, perdas, surpresas e aprendizados. Cada carta se tornou uma forma de enxergar meus filhos como pessoas únicas e de construir, junto com eles, uma vida mais generosa, empática e amorosa.
Registrar cada momento também reforça a importância de cuidar de nossas emoções e da saúde mental, valorizando a vida e aprendendo a lidar com nossas dores, lembrando o espírito do Setembro Amarelo.
Registrar cada momento me mostrou que, no fim das contas, são os pequenos gestos do dia a dia que eternizam a vida e transformam nossa história em memória afetiva.
Por Flavia Camargo
advogada formada pela UFRJ, mãe de três filhos, autora de sete livros, finalista do Prêmio Ecos de Literatura, autora do romance epistolar “Enquanto Vocês Crescem – As cartas de amor de uma mãe”
Artigo de opinião