Violência de Gênero no Brasil: 19 Anos da Lei Maria da Penha e o Alto Preço Social e Econômico

Apesar dos avanços legais, a violência contra a mulher persiste com custos bilionários que impactam toda a sociedade brasileira.

Aprovada em 2006 e reconhecida pela ONU como uma das legislações mais avançadas do mundo no enfrentamento à violência doméstica, a Lei Maria da Penha completou 19 anos em agosto. No entanto, os números mostram que o país ainda está longe de oferecer às mulheres a proteção efetiva prevista em lei.

Somente entre janeiro e julho deste ano, a Central de Atendimento à Mulher, do Ministério da Mulher, registrou 86.025 denúncias, o que corresponde a uma média de 16,9 casos por hora. O problema não se restringe à violência física extrema, mas ela ainda é alarmante: são, em média, quatro feminicídios e mais de dez tentativas de assassinato por dia. Em 80% dos casos, o agressor é o companheiro ou ex-companheiro.

As medidas protetivas, embora essenciais, ainda encontram barreiras. Das 555 mil concedidas no ano passado (88% das solicitadas), mais de 100 mil foram descumpridas. Nos últimos dois anos, ao menos 121 mulheres foram mortas mesmo sob proteção judicial.

Na Bahia, o cenário não é diferente. A 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, do Instituto DataSenado, revela que 27% das baianas já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar provocada por um homem; 23% passaram por isso apenas nos últimos 12 meses. A percepção de agravamento do problema é majoritária: 74% das brasileiras acreditam que a violência doméstica aumentou. Já entre as baianas, esse índice chega a 81%. Além disso, 65% afirmam conhecer uma amiga, familiar ou conhecida que já tenha sido vítima.

Os impactos vão além do drama humano. A violência contra a mulher gera perdas econômicas bilionárias. Afeta a produtividade, aumenta o número de afastamentos do trabalho, eleva a dependência social e sobrecarrega os serviços de saúde, segurança e assistência. Empresas enfrentam queda de desempenho, alta rotatividade e custos indiretos com licenças e substituições.

O peso também recai sobre os cofres públicos. Atendimento médico, apoio psicológico, ações policiais e processos judiciais representam gastos expressivos. Recursos que poderiam ser investidos em prevenção, educação e desenvolvimento acabam sendo usados para mitigar danos.

Estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que data de outubro de 2021, estima que o fim da violência contra a mulher poderia gerar, em dez anos, mais de R$ 214 bilhões para o PIB brasileiro, criar 2 milhões de empregos, acrescentar R$ 97 bilhões à massa salarial e elevar em R$ 16,4 bilhões a arrecadação tributária.

Em quase duas décadas, a Lei Maria da Penha representou um avanço inegável, mas a persistência de índices alarmantes e de custos bilionários deixa claro que a violência de gênero não é apenas um drama humano — é também um gargalo econômico que freia o potencial do país.

Transformar a proteção às mulheres em prioridade nacional, com ações coordenadas entre governo, iniciativa privada e sociedade civil, não é gasto: é investimento com retorno certo em produtividade, geração de empregos e fortalecimento social.

Cada real investido em prevenção, acolhimento e punição retorna multiplicado para a sociedade. Tratar a violência de gênero não apenas como uma emergência social, mas como estratégia de desenvolvimento econômico, é condição indispensável para construir um Brasil mais justo, seguro e próspero.

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Por Tania Cristina Teixeira

Presidenta do Conselho Federal de Economia (Cofecon); Graduada em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais; Doutorado em Economia Aplicada pela Universidade de Valencia (Espanha); Coordenadora de Extensão na PUC Minas

Artigo de opinião

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