Os Impactos Profundos da Sexualização Infantil e a Urgência de Proteção Efetiva
Vídeo-denúncia mobiliza política e sociedade para enfrentar a adultização precoce e seus graves efeitos psicológicos
O vídeo-denúncia publicado pelo influenciador Felipe Bressanim, mais conhecido como Felca, sobre casos de exposição e sexualização de crianças nas redes sociais trouxe à tona um tema urgente e ainda pouco enfrentado com a seriedade necessária. A gravação, que já ultrapassa 36 milhões de visualizações no YouTube, revelou conteúdos em que menores de idade são expostos de forma inapropriada e, em alguns casos, inseridos em ambientes e dinâmicas de conotação sexual.
A repercussão foi imediata e ganhou novos desdobramentos. No Congresso, 32 projetos de lei foram apresentados à Câmara dos Deputados para criminalizar a adultização infantil, suspender a monetização de conteúdo produzido por menores e criar exigências legais para publicações envolvendo crianças. O presidente da Casa, deputado Hugo Motta, declarou que o tema entrou na pauta prioritária. No Senado, 70 parlamentares já assinaram o pedido de abertura de uma CPI para investigar o papel de influenciadores e plataformas na exploração infantil online.
Na esfera judicial, a Justiça da Paraíba determinou a interrupção da monetização dos conteúdos ligados ao influenciador Hytalo Santos, proibiu o contato dele com menores e instaurou investigação sobre possível omissão dos pais das vítimas. Nesta semana, Hytalo foi preso no âmbito das apurações, reforçando o peso das denúncias e a gravidade do caso. Gigantes da tecnologia, como Meta e Google, também foram instadas a explicar quais ações tomaram para conter a propagação de conteúdo denunciado.
Para a psicóloga Êdela Nicoletti, especialista em Terapia Comportamental Dialética (DBT) e em Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), a discussão precisa ir além da indignação momentânea. “Em contextos de abuso sexual, online ou offline, há forte associação com TEPT e dissociação, e parte dos estudos também liga esse histórico à desregulação emocional e a traços de personalidade borderline na vida adulta. Não são certezas para todos os casos, mas evidências consistentes mostram que o risco é elevado”, explica.
O psicólogo Vinícius Dornelles, da DBT Brasil e mestre em cognição humana, também vê o episódio como um retrato do momento que o país vive. “É simbólico que um vídeo de influenciador tenha conseguido mobilizar até a Câmara dos Deputados para discutir o tema, quando pesquisadores e profissionais da área alertam para esses riscos há anos sem a mesma resposta”, observa.
Para ele, a situação evidencia o poder das redes sociais na definição da agenda institucional e a necessidade urgente de que a ciência seja valorizada como principal balizadora das decisões de proteção à infância. “Se dependermos apenas da viralização de um conteúdo para que o poder público aja, corremos o risco de perder tempo precioso e vidas que poderiam ser salvas”, afirma, lembrando que os índices de condutas autolesivas entre crianças e adolescentes no Brasil têm crescido de forma preocupante.
Êdela ressalta ainda outro ponto que merece destaque: o uso da internet como ferramenta de conscientização. “Quando figuras públicas expõem práticas nocivas com dados e contexto, contribuem para gerar mudanças e pressionar por medidas de proteção efetivas. Mas isso exige responsabilidade e compromisso ético”, ressalta.
Os especialistas reforçam que o caminho mais eficaz é a prevenção, aliada à educação e à atuação integrada de famílias, escolas, autoridades e plataformas digitais. “Depois que o dano está feito, o processo de reconstrução é mais longo e doloroso. Nenhuma visualização ou monetização justifica o risco para uma criança”, conclui Êdela.
Por Dérek
Artigo de opinião