Maternidade real: por que as mães fora do padrão ainda são invisíveis na publicidade?

Em meio a avanços, campanhas do Dia das Mães perpetuam estereótipos e ignoram a pluralidade das famílias brasileiras. Especialista analisa os desafios e aponta caminhos.

O Dia das Mães é, tradicionalmente, marcado por comerciais que exibem mulheres impecáveis, filhos obedientes e lares harmoniosos. Mas Manuela Bertoletti, diretora de comunicação da Abradi e mãe de três adolescentes, questiona: quantas mães reais se veem nesses retratos idealizados? Em um artigo franco, ela destaca a dissonância entre a publicidade e as múltiplas faces da maternidade contemporânea.

Do estereótipo à complexidade
Por décadas, a figura materna na mídia foi reduzida a uma mulher sorridente, sempre disponível e com energia infinita. “Essa imagem inatingível gerava culpa”, afirma Manuela. Embora campanhas recentes tenham começado a explorar realidades mais caóticas – mães solo, LGBTQIAPN+, negras ou lidando com desafios emocionais –, a autora ressalta que a representação ainda é tímida e pouco diversa.

O peso do ‘superpoder’ materno
Um dos pontos críticos destacados é a romantização da mulher que “dá conta de tudo”. “Isso não é empoderamento, é armadilha”, alerta Manuela. Campanhas que glorificam a exaustão, em vez de questionar a distribuição desigual de responsabilidades, reforçam um modelo ultrapassado. A solução? Valorizar redes de apoio e mostrar que dividir tarefas não é fracasso, mas evolução social.

Falta representatividade – e honestidade
Apesar de o Brasil ser um país plural, a publicidade ainda privilegia mães brancas e de classe média. “Onde estão as mães indígenas, periféricas ou com deficiência?”, provoca a especialista. Ela cita uma campanha recente que a emocionou ao retratar conflitos com um filho adolescente: “Mostraram medo, cansaço e dúvidas, não apenas alegria. Isso é revolucionário”.

O caminho para conexões autênticas
Para Manuela, marcas que desejam se conectar verdadeiramente às mães modernas precisam:
1. Amplificar vozes plurais: incluir diferentes realidades socioeconômicas, raciais e estruturais de família.
2. Humanizar, não idealizar: exibir dias desarrumados, frustrações e vitórias pequenas.
3. Promover responsabilidade compartilhada: destacar pais, avós e comunidades no cuidado.

“Quando uma campanha mostra uma mãe chorando no banheiro após uma discussão com os filhos, ela não está sendo derrotista. Está sendo corajosa”, reflete. Em 2025, a demanda é clara: as mães não querem flores retocadas no Instagram. Querem se reconhecer nas telas – com toda a complexidade que as torna humanas.

*Manuela Bertoletti é diretora de comunicação da Associação Brasileira dos Agentes Digitais (Abradi) e mãe de três adolescentes. Seu trabalho foca em ética publicitária e representatividade.*

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