Efusão de culturas, rituais e das raízes do povo brasileiro inspiraram a arquiteta Isadora Araujo em seu projeto de banheiro na CASACOR São Paulo 2024

Estreante na mostra, a profissional se pautou no sincretismo religioso para elaborar o ambiente que estimula o convívio das forças da natureza dentro da criação divina e na manutenção da justiça

O sincretismo religioso é uma das características mais marcantes da cultura brasileira e foi essa riqueza de referências e sinônimo de resistência que inspirou o projeto da arquiteta Isadora Araujo, do Panapaná Estúdio, na CASACOR São Paulo 2024. O Banheiro Sincrético foi construído com elementos que lembram a orixá Nanã Buruqûe, e Sant’Anna, mãe de Nossa Senhora – evocando a atmosfera sagrada para ambientes inusitados.

Além do poder simbolizado pela mãe da padroeira do Brasil, Nanã Buruqûe, senhora das águas paradas e a mais sábia dos orixás, denota a origem do homem na Terra, conforme as religiões de matrizes africanas. A intenção da profissional, que debuta na mostra, foi potencializar no cotidiano a força da natureza feminina na criação divina e na manutenção da justiça, características que ambas carregam.

Na concepção do projeto, o espaço unissex, de 40 m², é demarcado por uma grande antessala composta por lavatórios e generosas cabines. Essa disposição é fruto de um estudo sobre a intersecção que envolve a fusão de diferentes tradições, crenças, práticas e expressões de cunho artístico e filosófico. “Todos esses vieses, indubitavelmente, formam as raízes do povo brasileiro“, analisa Isadora.

A bancada, de mármore Calacata bruto, recebe o visitante no espaço em uma alusão à túnica branca de Sant’Anna, representando a pureza do universo espiritual. Já o véu verde da santa, que remonta à simplicidade e renovação, é retratado pela cerâmica da mesma cor, com efeito martelado, da Ceusa.

Ao fundo do Banheiro Sincrético, de Isadora Araujo, a bancada de mármore Calacata Bruto recebe as cubas de apoio e torneiras esculturais, da Deca | Fotos: Mariana Camargo

O cobre, elemento de Nanã, marca presença no tom eleito para as portas das cabines, os metais Deca e os detalhes do mobiliário. A cor distintiva da orixá, o roxo, é percebido em flores e arranjos eleitos para adornar o banheiro. Já a natureza de Nanã, exteriorizada pelos elementos água e terra, foi perpetuada na textura e na tonalidade coral selecionada para emoldurar a gallery wall dos lavatórios. Enquanto isso, as oferendas que a entidade gosta, como o milho cozido ou pipoca, são compreendidos por meio dos delicados pontos de luz da luminária central do ambiente.

Na circulação do espaço, Isadora Araujo trouxe uma essência de sala de estar ao mesclar poltronas e a gallery wall com diversas obras de arte, da Mh8arte. No piso, os ladrilhos hidráulicos (Piastrella) são assinados por Richard Pieper | Fotos: Mariana Camargo

De acordo com a arquiteta, o trabalho empreendido para a escolha da paleta cromática, da iluminação, dos móveis e das obras de arte complementam a releitura das duas entidades ancestrais por meio de simbolismos incluídos em uma visão atraente, criativa e que não interferiu na usabilidade do banheiro. “Pelo contrário, nosso projeto arquitetônico garante a circulação efetiva das pessoas, aliada à experiência repleta de significados“, reitera a arquiteta.

Além da carga ancestral que conduz o visitante no resgate do sagrado para as áreas de convivência do cotidiano, as diretrizes ambientais trazidas por Isadora vão de encontro com as tendências de preservação da natureza. Enquanto a paginação de revestimentos propõe o mínimo de cortes e conduz ao reaproveitamento de todos os acabamentos, os pisos assentados pela técnica de intertravamento promove menos demanda de materiais.

Na interpretação que Isadora desenvolveu sobre o tema da mostra: ‘De presente, o agora’, ela analisa que a crença nas duas divindades, que seguem de geração em geração tanto nas raízes culturais, como naquelas que constituem a fé praticada por nossos familiares, fundamenta o passado como trampolim para o presente. “Assim como Nanã Buruqûe e Sant’Anna são referenciadas nos terreiros e nos altares, a arquitetura contemporânea também nos permite essa conexão que se alinha, em mão dupla, entre o interno de cada um de nós e o externo“, avalia Isadora.

Assim, traçando uma relação com o presente, a sustentabilidade nos projetos é um caminho que conduzirá a espécie humana para o futuro. Para tanto, o Banheiro Sincrético incorporou peças que, até então seriam rejeitadas, caso da bancada, que após a mostra ganhará uma nova utilização. Também houve a diminuição do uso de drywall e de resíduos ao compatibilizar as divisórias com os vizinhos, além das torneiras serem automáticas, economizando água. Nas cabines, as válvulas de descarga de fluxo duplo completam o compromisso com o meio ambiente.

A arquiteta Isadora Araujo em uma das cabines do seu Banheiro Sincrético, atração da CASACOR São Paulo 2024 | Foto: Mariana Camargo

O toque final são as luminárias acústicas, produzidas em Micélio, material inovador e 100% biodegradável, a partir da raiz de cogumelos, com lâmpadas de LED. “Sincretizar é reunir, priorizar o total, o conjunto. No campo religioso, o verbo pode ser visto como uma forma de resistência e desempenhou um papel fundamental na construção da identidade cultural do Brasil. E nosso desejo foi justamente o de emanar essa vibração para os espaços de convívio”, explica Isadora.

Com o tema “De presente, o agora”, a CASACOR SP 2024 acontece de 21 de maio a 28 de julho, no histórico edifício do Conjunto Nacional.

SERVIÇO

CASACOR São Paulo 2024

Onde: Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, 2073.

Quando: de 21 de maio a 28 de julho de 2024.

Horário de funcionamento do evento:

Terça a Sábado das 12h às 22h.

Domingos e Feriados das 11h às 21h.

Horário bilheteria: Terça a Sábado das 12h às 20h.

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