“Essa Maré”, álbum de estreia de Luiz Otávio, tem produção e participação de Mart’nália

Tecladista e cavaquinista da banda de Mart’nália, Luiz Otávio vinha se mostrando à vontade nos vocais que fazia de improviso nos shows. “Ele tem uma voz bonitona, fazia uns djubidjubi que não é qualquer músico que faz”, descreve a cantora, com sua irreverência característica. Atenta, ela o chamou para cantarem juntos uma música do roteiro e, não demorou, começou a provocá-lo com a ideia de um disco solo dele, soltando a garganta. Assim nasceu “Essa maré” (Biscoito Fino), que chega agora às plataformas de streaming, com produção da madrinha Mart’nália. Ouça aqui.

Em “Essa maré”, o pianista e cantor Luiz Otávio mostra canções próprias e releituras de Djavan, Arlindo Cruz e Don Beto, costurando referências que vão de Campo Grande a Copacabana. Mart’nália produz o álbum e participa num dueto com o artista.

Romantismo black carioca por Leonardo Lichote

Mergulhado numa sonoridade black suburbana, que remonta à elegância quente de bailes da Zona Norte e da Zona Oeste, “Essa maré” traz sete faixas. Três são releituras de canções de Djavan, Arlindo Cruz e Don Beto – pistas de algumas das filiações do artista. As outras quatro são composições próprias de Luiz Otávio – uma delas em parceria com Tom Karabachian.

Apesar de “Essa maré” ter sido concebido nos últimos meses, a partir da sugestão de Mart’nália, sua história começa bem antes. Na verdade, ela tem origens ainda na infância do músico, no subúrbio carioca de Campo Grande, na década de 1990. O músico de 33 anos lembra: “Ganhei um tecladinho de brinquedo dos meus pais e, com 4, 5 anos já estava tirando músicas que ouvia no rádio”. Sua família ouvia muito samba e pagode, uma das influências centrais nesse primeiro momento. “Minha lembrança mais antiga sou eu tocando ‘Essa tal liberdade’, do Só Pra Contrariar”, conta.

Outros sons o interessavam. Deficiente visual desde o nascimento, mantinha os ouvidos atentos a tudo: o Raul Seixas que seu tio adorava e que ele passou a adorar também; o jazz do Sexteto Onze e Meia, banda que ele ouvia na TV entre as entrevistas do programa de Jô Soares; a MPB nas trilhas de novelas, em especial a bossa nova que acompanha as tramas de Manoel Carlos. Essas e outras referências entram no caldeirão que une qualidade musical e apelo popular e que Luiz Otávio revela agora em “Essa maré”.

O calor da rua que sua música traz não é um acaso. Luiz Otávio rodou diversos cantos do Rio, de Copacabana a São Gonçalo, para tocar – sem valorizar as dificuldades por ser deficiente visual e por morar num bairro afastado de onde apareciam as chances de trabalhar. “As pessoas falavam: ‘Infelizmente não posso te chamar pra tocar porque não tenho carro pra te buscar’. Eu dizia: ‘Não tem problema, eu vou de ônibus’. E ia levando teclado, guarda-chuva, bengala…”, recorda.

Oportunidades aumentaram quando Luiz Otávio foi apadrinhado pelo pianista Fernando Merlino, seu professor, e pelo baixista Arthur Maia, com quem tocou por oito anos. Foi Arthur, amigo de Mart’nália, que o apresentou à cantora. Nos últimos anos, tocou com Marcelo D2 e gravou nos discos mais recentes de Martinho da Vila e Elza Soares (esse ainda inédito).

“Essa maré” é o segundo disco de Luiz Otávio, e o primeiro de canções. Sua estreia em álbum foi instrumental, e era esse o caminho que ele parecia que ia trilhar em sua carreira. Mas quando a ideia do disco começou a ganhar força, o músico achou que devia compor. Começou a escrever melodias e, numa noite de insônia, escreveu letra para duas delas. Gostou da brincadeira e fez uma leva, da qual selecionou as quatro autorais do disco.

Em seu método de compor, sempre faz a letra a partir da melodia, buscando as palavras que se encaixam melhor naquelas notas. A parceria com Tom Karabachian, “Custe o que custar”, é exceção – ele fez a música para os versos do parceiro.

Nas letras, Luiz Otávio explora o amor em diversas formas. “Quem disse” é uma cantada desencanada e alegre; “Já tô” – que ganhou vídeo, faz pedido de desculpas sedutor; “Custe o que custar” destila o lamento e a superação pelo fim do amor; “Essa maré” declara a paixão e convida ‘Vambora, simbora comigo/ Agora não tem mais perigo/ Se deixe envolver/ e deixa acontecer”.

As três regravações, pérolas escondidas do repertório de seus compositores, seguem o mesmo espírito suingado e romântico. São elas “Pensando nela”, de Don Beto; “Não penso em mais nada”, de Arlindo Cruz; e “Meu”, de Djavan. Nesta última, Luiz Otávio tem a participação de Mart’nália, com quem faz um dueto.

A banda de alto nível que acompanha Luiz Otávio (voz, piano e teclados) no disco é formada por amigos com quem já toca há algum tempo – a intimidade e a qualidade transparecem no resultado. A formação tem Thiago Silva (bateria); André Siqueira (percussão); João Rafael e Alexandre Katatau (dividindo-se nos baixos); Julio Raposo (guitarra); Marcelo Martins (sax, flauta e arranjos de sopros); Diogo Gomes (trompete); e Rafael Rocha (trombone).

É o próprio Luiz Otávio que amarra a definição da sonoridade de “Essa maré”, usando o mesmo balanço com que toca e compõe: “É uma mistura muito natural de soul, samba, balada, MPB, pop, uma pitada de funk e rap…  Enfim, é um disco carioca”.

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