Campanha chama atenção para saúde de transexuais vítimas de grave problema de saúde pública
Para esconder órgão sexual masculino, mulheres transgêneros sofrem com infecção e insuficência renal
“Eu me aquendava com fita crepe. Se ficasse qualquer volume, meus colegas falavam alguma coisa. Eu não conseguia ir ao banheiro, evitava ao máximo beber água. Era cansativo, me machucava, chegava a assar, a dar alergia. Mas eu não tinha escolha”. O relato é de Melina Queiroz, de 22 anos, modelo. Mas podia ser de várias outras mulheres transexuais que vivem ou viveram situação semelhante. Pessoas que não tiveram escolha.
Seja por incômodo, disforia de gênero ou para se proteger da violência no país que mais mata trans do mundo, aquendar é uma prática usada entre as travestis, cross dressers, drag queens e mulheres trans para esconder o órgão genital, puxando-o para trás, entre as nádegas. Mais do que uma questão estética, que as ajuda a se conectar com seu corpo, é um modo de sobrevivência. Ao esconder a protuberância, elas se protegem de olhares discriminatórios e da intolerância.
Entretanto, a prática é feita de forma rudimentar, com a utilização de colas, fitas adesivas e barbantes, provocando assaduras, bolhas, dores e ferimentos. Ela também impossibilita o uso regular do banheiro já que desfazer a aquendação é, além de extremamente dolorido, demorado e trabalhoso. Assim, mulheres trans passam horas sem beber água na tentativa de adiar este momento. A consequência inevitável são os problemas renais, que podem levar a infecções, pedra nos rins, necessidade de hemodiálise e, em casos mais severos, à morte.
O urologista Marcelo Magalhães, especializado em saúde LGBTQIA+, explica que a principal causa de problemas urinários são os hábitos. “Beber pouco líquido deliberadamente para não ir tanto ao banheiro e segurar a urina por muito tempo podem levar a infecções urinárias e formação de cálculos urinários. É o que acontece com as pessoas com pênis que escondem o genital e evitam o trabalho de ir ao banheiro, por exemplo”.
O problema é uma grave ameaça à saúde pública. Ao tomar contato com essa realidade, a técnica em hemoterapia Silvana Bento não se conformou. “Saber que várias mulheres transexuais chegavam ao ponto de ter que fazer hemodiálise ou se submeter a cirurgias por causa disso, mexeu comigo”, conta. Motivada pela perda de uma amiga nessas condições, Silvana desenhou e patenteou uma calcinha em forma de funil, criada especificamente para esse público. Com um design extremamente confortável, fácil de colocar e tirar, o modelo traz a segurança e o conforto necessários para o dia a dia.
Nesta semana, a agora empresária lançou uma campanha para a marca, a Trucss, Lingerie para mulheres trans. Veiculada na TV Record e repostada nas redes sociais da apresentadora Sabrina Sato, a ação joga holofote em uma alternativa que reúne estilo, design, saúde, segurança e sofisticação em um produto simples, que pode ajudar a mudar a realidade de uma população invisibilizada. “Nosso objetivo é conseguir ganhar escala para baratear o produto e possibilitar que o maior número possível de mulheres trans se sinta confortável e possa fazer o básico de qualquer ser humano, que é ir ao banheiro sem dificuldades,” conclui Silvana, mostrando que, agora, as mulheres trans têm escolha.