Cadê a mãe dessas crianças?

por Ton Kohler

Eu ouvia essa pergunta rotineiramente quando eles eram menorzinhos, quando eu chegava num buffet infantil com os dois no colo, quando ia para o hospital por conta de alguma emergência, em restaurantes, nas lojas de roupas e etc.

Quando tudo aconteceu eles eram de colo e tinham 1 e 3 anos. Ela, a Mariana, sempre foi muito apegada a mim e o irmão a mãe. Com a partida da Renata, minha esposa e mãe das crianças, eles buscavam sentir-se mais seguros e queriam sempre estar grudado no meu peito, enrolados nos braços, abraçados as minhas pernas e era muito comum me ver andando com os dois no colo. Ainda bem que tinha saúde para dar esse colo duplo.

Apesar dos desafios de gerenciar as emoções do luto deles e o meu, eu não imaginava viver na pele o preconceito de uma tal incapacidade masculina de cuidar de duas crianças sozinho. Na verdade, eu nem sabia que isso existia.

“Ton, mas você não pensa em casar-se logo para dar uma mãe para essas crianças?”. “Ton porque você não deixa um filho com cada avó para cuidar da sua carreira”.

Essa e outras perguntas inconvenientes apareciam sem mais nem menos. No começo eu achava que eu estava fazendo algo errado e só depois de alguns meses eu fui entender que a sociedade foi culturalmente programada a não aceitar um homem cuidador, um homem que cozinha, lava, passa e trabalha fora.

“Um homem jovem não merece viver assim”, disse uma senhora numa festinha infantil dos amiguinhos da escola. Como se cuidar dos próprios filhos fosse um fardo pesado demais para um homem carregar, mas para uma mulher, ok!

Somos muito felizes embora tenhamos vivido um momento difícil. Geralmente eu recebo alguns elogios pelo pai e homem que me tornei, porém acredito que meu único mérito foi não deixar a peteca cair e conduzir essa fase com felicidade para que as crianças fossem minimamente impactadas. Ao mesmo tempo estudei tanto para transformar essa dor em algo bom, fui a fundo em conceitos de educação infantil, como lidar com traumas, fiz cursos e certificações parentalidade, uma porção de livros sobre educação respeitosa e até psicanálise!

Ver eles correndo, brincando e levando uma vida normal é orgulho do tamanho do mundo. Foram madrugadas chorando só, são anos assistindo sentimento se dissolverem e a vida encontrando brechas para desabrochar. E assim vem sendo.

Por outro lado, não consegui ficar apenas ouvindo essas vozes perdidas sobre a incapacidade masculina, fui para internet, postei textos, vídeos falando sobre a sobrecarga que as mulheres enfrentam, a tal da carga mental que judia e adoece mães.

Falei em como nós homens somos relapsos com a compreensão desse mundo do cuidado, mostrando a importância de ser
participativo, de que nenhuma roupa vai parar no guarda-roupa sozinha, nem as vacinas no sangue das crianças, as agendas com os médicos e que não basta cumprir com a obrigação financeira e entregar um celular ou tablet para o filho.

Fiz palestras para milhares de pessoas para que todos tenham uma vida em casal mais plena, sem a necessidade de passar por uma experiência como a minha. Fiz mentorias e cursos para mães e pais para entenderem o quanto antropologicamente temos comportamentos padrões que interferem na felicidade familiar e na educação dos filhos.

Eis a minha jornada, um caminho de transformação e de ressignificados, o qual tenho o prazer imenso em dividir contigo neste texto.

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