Existe relação entre segurança alimentar e ESG?

Patricia Punder, advogada e CEO da Punder Advogados e Marcelo Alambert, engenheiro agrônomo na Punder Advogados

Qual a relação entre segurança alimentar e ESG (Environment, Social and Governance) – Meio Ambiente, Social e Governança na sigla em inglês? É possível afirmar que há relação intrínseca, principalmente se pensarmos nas letras “S”, social, e “E”, environment.

Gostaria de citar um exemplo, ocorrido no final do mês de maio do corrente ano, a apreensão de 4.200 toneladas de feijão-caupi pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea).  O feijão continha defensivo agrícola não permitido pelo MAPA, um risco para a alimentação humana.

Significa a falta de responsabilidade da empresa em relação a sua cadeia de fornecedores, pois os programas de ESG para serem efetivos devem ter um olhar atento em relação aos fornecedores e como estes fazem a sua gestão, principalmente, no tocante ao uso de defensivo agrícola proibido. Sem este olhar atento, existe neste caso o perigo da comercialização de um produto alimentar, da cultura brasileira, que pode causar malefícios a saúde da sociedade consumidora.

Muito além do imaginário comum de grande parte da população, o uso de defensivos agrícolas possui regras rígidas que devem ser seguidas pelos produtores rurais. Para o MAPA permitir o uso de defensivos agrícolas, diversos estudos são realizados para determinar as doses máximas a serem usadas nos diferentes cultivos, o número máximo de aplicações e o tempo decorrido entre a última aplicação e a colheita (carência), dentre outras pesquisas que o MAPA exige para o registro de tais produtos, químicos ou biológicos.

Hoje, o MAPA está muito mais atento ao descumprimento de tais regras. A evolução da tecnologia facilitou a detecção de químicos, onde é possível rastrear centenas de moléculas em uma mesma análise laboratorial, até poucos anos, era realizada apenas uma única molécula por análise.

Portanto, a investigação de possíveis excessos em frutos, legumes, verduras e cereais tornou-se extremamente descomplicada. Consequentemente, existe o risco na aplicação de multas sobre produtores rurais e, de forma solidária, as empresas compradoras destes produtos, atacadistas, cooperativas, supermercados e distribuidores de alimentos.

É importante frisar que empresas que alardeiam que são ESG e fazem propagandas para divulgar seus programas possuem o risco de terem uma crise reputacional grave caso não tomem os devidos cuidados com seus fornecedores. Uma vez que é uma prática muito comum no mercado de alimentos, as empresas fecharem contratos onde estão definidas que o fornecimento das sementes e demais materiais, incluindo agrotóxicos ou defensivos agrícolas, serão fornecidos pela empresa contratante. Portanto, cabem as estas empresas terem uma estrutura do conhecimento regulatório internamente ou, se não for possível, a contratação de especialistas em agronomia para ajudar.

Somos um país onde 33 milhões de pessoas estão em situação de insegurança alimentar, mas isso não significa que podemos deixar as empresas comercializar produtos alimentícios que causem mais malefícios do que benéficos para a sociedade. Responsabilidade corporativa e mudança de midset são as chaves para um programa efetivo de ESG.

Patricia Punder – Advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da FIA e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patrícia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil). www.punder.adv.br

Marcelo Alambert – Engenheiro agrônomo formado na ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), Universidade de São Paulo, e mestre em Agroenergia pela Fundação Getúlio Vargas, além de possuir MBA em Gestão Empresarial pela FIA. Possui vasta experiência em temas relacionados a energia, agronegócios e meio ambiente em vários segmentos e mercados. Atuou em diversas multinacionais no Brasil por mais de 15 anos. Tem sólida expertise em projetos voltados para ESG, principalmente para desenvolvimento de soluções e gestão de métricas em projetos ambientais para empresas.

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