Pobreza menstrual: um problema que vai além da higiene íntima
Sem absorventes, recursos financeiros e falta de saneamento básico apropriado, população de baixa renda está entre a mais atingida no Brasil
A pobreza menstrual é o termo usado à falta de acesso aos produtos básicos e indispensáveis para manter a higiene no período da menstruação. Mesmo sendo uma função fisiológica completamente normal, não se restringe apenas à carência de recursos financeiros para comprar absorventes, mas está relacionada diretamente às condições de moradia, como escassez de banheiros, água e até ausência de saneamento básico apropriado.
Segundo dados da última pesquisa do IBGE para Síntese de Indicadores Sociais (SIS), no Brasil, existem cerca de 7,2 milhões de pessoas vivendo em situação de extrema pobreza em contextos urbanos ou rurais, que podem ser afetadas diretamente por essa condição social.
Para Nicole Campos, gerente de estratégia de programas da ONG Plan International Brasil – instituição sem fins lucrativos com projetos globais voltados às crianças e adolescentes, “Quando falamos sobre saúde menstrual, devemos ter atenção especial ao recorte etário e também aos recortes de identidade de gênero, raça, etnia e territorial. Nem todas as pessoas que menstruam, especialmente as mulheres e as meninas, vivenciam a menstruação de forma igual. Por isso, as políticas públicas têm que ter em conta as questões que atravessam suas especificidades para trabalhar nas causas e melhorar cada área. É papel do Estado coletar dados sobre as mulheres, as meninas e pessoas que menstruam que estão na pobreza e quais são as questões que elas mais enfrentam para atuar em políticas eficazes na educação, na saúde e no mundo do trabalho”.
Uma das principais consequências da pobreza menstrual, além de estigmas e discriminação, é a evasão escolar. “As escolas precisam ter banheiros equipados, com acesso à água, à privacidade para as meninas, com produtos adequados. Inclusive com a distribuição de absorventes e outros produtos para coletar o fluxo menstrual.”
E como resolver pobreza menstrual?
É evidente que o problema da pobreza menstrual é multifatorial e vai além da higiene íntima. Por isso, não existem respostas simples, mas sim soluções que devem ser propostas a muitas mãos e tratadas coletivamente pela sociedade, pelas escolas e pelo Estado. “É muito importante trazer a dimensão da garantia de direitos quando falamos de pobreza menstrual, porque a pobreza menstrual é consequência da não garantia dos direitos humanos das meninas, mulheres e pessoas que menstruam, ressalta Nicole.
Entre os recursos que vem sendo usados para minimizar os impactos da pobreza no universo da higiene íntima é o uso de coletores menstruais reutilizáveis da Violeta Cup, que já doou mais de oito mil itens para projetos sociais. Confeccionado em 100% silicone, hipoalergênico e sem químicos, esse produto tem durabilidade de até três anos e é uma alternativa de baixo custo em relação ao absorvente comum, pois, durante o período, uma pessoa gastaria cerca de R$ 360,00 com o item de higiene íntima tradicional e com o coletor menstrual apenas R$ 49,90, gerando uma economia R$ 310,00.
Uma das medidas para assegurar a doação dos recursos de higiene íntima para combater à pobreza menstrual no Brasil foi a criação da lei 14.214/21 – que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, fruto do projeto 4968/19, da deputada federal Marília Arraes (PT-PE). Norma beneficia estudantes carentes dos ensinos fundamental e médio, mulheres em situação de vulnerabilidade e presidiárias.
Considerado pelos ginecologistas super-higiênico (sem aquele odor característico causado pelo contato do sangue menstrual com o algodão e o ar), o produto possui baixo risco de infecções e alergias e, quando bem colocado, as chances de vazamento são quase nulas. Sem contar que, em média, cada brasileiro (a) joga três quilos de absorvente no lixo por ano. Levando em conta que um indivíduo tem um ciclo menstrual dos 11 aos 54 anos, em toda a sua vida gastará mais de 130 quilos de absorventes, o que possui o meio ambiente – de acordo com dados do Recicla Sampa.
Para ginecologista Renata Cavalcante, os absorventes descartáveis possuem inúmeras substâncias químicas que causam desconfortos, além de poderem causar odores característicos durante o período menstrual. “observo muitas reclamações de pacientes, que relatam coceiras e irritações, já que eles alteram o ph natural da região. Os coletores menstruais ainda são feitos para não liberarem nenhuma substância química, por isso não causam todas estas alterações e podem comprometer a saúde íntima. O uso do coletor menstrual faz com que a mulher se conheça mais, inclusive o seu fluxo menstrual, a anatomia da região íntima e – com isso, passa a criar uma relação diferenciada com o seu próprio corpo. E tem também as vantagens financeiras e ecológicas do coletor menstrual, nem se compara aos absorventes descartáveis, explica.
Apesar de incipiente no Brasil, o coletor menstrual não é nenhuma novidade, sendo criado e patenteado em 1937 por Leona Chalmers, na época com material feito de borracha. Na Europa e nos Estados Unidos, é uma realidade crescente já há alguns anos, onde é até difícil encontrar absorventes convencionais nas prateleiras das farmácias.
No país, já vem ganhando visibilidade entre as mulheres por conta de seus inúmeros benefícios, além do preço. Dentre os quais, o de ser um produto extremamente saudável para a higiene íntima, já que não resseca o canal vaginal e não absorve resíduos que são importantes para a saúde, o que proporciona um conforto para que se vá à praia ou pratique esportes com total naturalidade.