A angústia que movimenta e a ansiedade que paralisa: a vida e o cuidado de si diante do sofrimento psíquico contemporâneo

*Por Henrique Costa Brojato - Psicólogo, Mestre em Educação (PUCPR) e Professor da Estácio Curitiba

A ansiedade se mostra hoje como uma das grandes queixas em nossa sociedade. Seja nas diversas instituições a que pertencemos – família, escola, trabalho – seja no cotidiano em redes sociais, nos vemos hoje marcados por algo que nos faz padecer daquilo que ainda não está definido. Nesse cenário, o que temos nomeado como ansiedade se aproxima daquilo que nos faz ter que, ou nos vincular a um passado que não pode ser mudado ou a um futuro que não apresenta materialidade ou garantias; ou seja, padecemos enquanto sociedade de ausência de presente.

Os efeitos desse padecimento, também chamado de sofrimento psíquico, foram muito bem anunciados – ou denunciados – pelo filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, em seu livro chamado Sociedade do Cansaço. Além dele, outro renomado sociólogo chamado Zigmund Bauman, demonstrou o quanto o sofrimento, presente em nossa lógica societária e cultural, se dá na medida em que a ausência de materialidade e garantias também se manifesta como faltante no nível das relações sociais: tempos líquidos, ele diria.

Somado a essas perspectivas, precisamos considerar os impactos já vividos, assim como aqueles que ainda serão presenciados, da pandemia de COVID-19. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em estudo apresentado no início deste ano, a prevalência global de depressão e transtornos relacionados à ansiedade teve um aumento de 25%. Esse dado estatístico levou diversos países a aumentar seus investimentos em políticas de saúde mental e atenção psicossocial, demonstrando grandes preocupações com a população em geral.

É aqui que precisamos dar lugar para compreender que o momento que vivemos é bastante peculiar. Contudo, os motivos que levaram ao agravamento de crises em saúde mental precisam ser considerados dentro de aspectos históricos e culturais, por meio dos impactos de nossa dinâmica produtiva e sua relação com a concepção de humanidade que queremos perpassar para as futuras gerações.

Nesse contexto, entre passados, futuros e ausência de presente, a sensação que temos, e que se repete em meu cotidiano profissional por meio de questionamentos e reflexões de tantos sujeitos, é de que algo nos demanda o tempo todo, nos fazendo paralisar diante do nosso próprio projeto de vida. Aqui, nesse exato momento de crise, é que podemos sentir, além de depressões e ansiedades, a angústia. Ora, afinal de contas, o que fazer diante de um cenário como esse? Como deixar de ser capturado por algo tão em essência humano?

Do ponto de vista filosófico, a angústia não pode ser entendida como algo ruim, necessariamente. Pelo contrário, ela é quem aponta para nós a necessidade de mudanças, movimentos, escolhas. Assim, é importante um nível de angústia para que possamos nos implicar com nossa vida. Contudo, infelizmente, as crises de ansiedade, tão comuns em nossos dias e na clínica psicoterápica, têm se mostrado como sintoma de algo maior. Ora demonstradas na sensação de paralisia cotidiana, falta de perspectivas; ora manifestas nas famosas falas “não tenho tempo para mim mesmo”, ou mesmo “tem sido tão corrido ultimamente que nem tenho visto o tempo passar”. Creio que este é o momento histórico de refletirmos: seria o desamparo e falta de perspectivas de que muitos se queixam indícios de uma necessidade de maior conexão consigo mesmo e com aqueles que nos cercam? Afinal de contas, o que é possível fazer com essa acelerada paralisia – ou paralisada aceleração?

Acredito que um dos caminhos de superação dessa dicotomia angustiante e ansiogênica, é por excelência o deixar-se escutar. Deixar-se escutar, assim como escutar a si mesmo, em tempos de cansaço e liquidez, se mostram como desafios dentro de uma cultura que privilegia o imediato, em detrimento do tempo de vir a ser. Em outras palavras, a empatia pode ser revolucionária para nós mesmos e para quem está próximo de nós.

Por isso, em tempos tão difíceis, urge a invenção de espaços e tempos de acolhida, escuta e presentificação, inaugurando inéditos viáveis cotidianos em que se abaixe a voz das demandas sem fim, aumentando ressonâncias que nos aproximam de nós mesmos. Na família, diálogo e aceitação; na escola, tempos de reflexão e cuidado de si e do outro; nas relações sociais, estar efetivamente presente e aberto à alteridade. O que além disso é possível? Além dos devidos cuidados com sua saúde mental, tão publicizadas em redes sociais e outras formas de comunicação social, lembre-se que a angústia, afeto que não mente, surge como um sinal, que aponta para o mais essencial de toda essa discussão: cuidar de si mesmo, buscando maior integração entre o que você foi, o que você é e o que você poderá ser.

Henrique Costa Brojato – Psicólogo, Mestre em Educação (PUCPR) e Professor da Estácio Curitiba

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