Teste do pezinho ampliado no SUS vai acelerar diagnóstico de doenças raras
Lei que implementa teste do pezinho ampliado no SUS foi sancionada pelo presidente. Antes, o exame só existia na rede particular;
Existem entre 6 e 8 mil doenças raras no mundo, entre elas as Mucopolissacaridoses (MPS), identificáveis pelo teste do pezinho ampliado;
Sem o teste do pezinho, o paciente percorre uma jornada em vários médicos até ser encaminhado ao geneticista e identificar a doença, o que pode levar anos.
A disponibilidade do teste do pezinho ampliado no SUS, determinada a partir da lei 5043/2020, vai acelerar o diagnóstico de doenças raras, hoje realizado apenas na rede privada. O exame é feito a partir da coleta de sangue do calcanhar do bebê, entre o terceiro e quinto dia de vida, e é capaz de diagnosticar mais de 50 doenças.
Especialistas destacam que a lei, sancionada pelo Presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (26), é um avanço para identificar e iniciar precocemente o tratamento de uma série de doenças raras, como a Mucopolissacaridoses (MPS), cujo tipo mais comum no Brasil é conhecido como Síndrome de Hunter.
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que existem entre 6 e 8 mil doenças raras no mundo. Destas, apenas 4% contam com algum tipo de tratamento e 30% dos pacientes morrem antes dos cinco anos de idade, principalmente por conta do diagnóstico tardio, que acaba impedindo o tratamento adequado da doença para que ela não chegue ao seu estágio mais avançado.
No Brasil, estima-se que 13 milhões de pessoas tenham alguma doença rara. O teste do pezinho realizado atualmente no Sistema Único de Saúde (SUS) detecta apenas seis doenças, enquanto a versão ampliada chega a 53, incluindo as patologias raras, que podem influenciar o desenvolvimento neurológico, físico e motor da criança.
Assim como nas demais doenças raras, as MPS são de difícil diagnóstico, uma vez que há múltiplos sintomas e muitos são comuns a outras patologias. Muitas vezes, os cuidadores passam de quatro a cinco médicos até receberem o diagnóstico e serem encaminhados para um especialista.
A geneticista, professora da Unifesp e membro da Sociedade Brasileira de Triagem Neonatal e Erros Inatos do Metabolismo (SBTEIM), Dra. Ana Maria Martins, explica que o objetivo do teste do pezinho é detectar doenças antes delas se manifestarem.
“O teste do pezinho ampliado melhora muito a qualidade de vida do recém-nascido brasileiro, já que quanto mais precoce é o diagnóstico, mais cedo a criança começa a ser tratada de maneira adequada, permitindo menores chances de haver complicações graves”, comenta Dra. Ana Maria. “Hoje, no Brasil todo, a grande maioria dos pacientes dessas doenças acabam morrendo sem diagnóstico. Este teste do pezinho ampliado vai evitar mortes prematuras e complicações irreversíveis”, complementa.
Para entrar em vigor, a lei do teste do pezinho ampliado depende de regulamentação do Ministério da Saúde.
Mucopolissacaridoses (MPS) – Por ter sintomas comuns em outras patologias, o diagnóstico das Mucopolissacaridoses (MPS) acaba sendo demorado e complexo. Crianças com a doença podem sofrer limitações articulares, perda auditiva, problemas respiratórios e cardíacos, aumento do fígado e do baço, além de déficit no desenvolvimento neurológico.
Todas estas manifestações são provocadas pela falta ou deficiência de enzimas necessárias para atividades químicas importantes para o organismo. A doença possui 11 tipos diferentes, cada um relacionado à deficiência de uma enzima específica. No Brasil, o tipo mais comum é a MPS II, também conhecida como Síndrome de Hunter.
As MPS são doenças hereditárias e afetam 1,57 em cada 100 mil nascidos vivos (dados do período de 1994 a 2018). Números da Rede MPS, entidade que reúne centros de tratamento para pacientes com a Síndrome de Hunter, mostram que 493 casos foram registrados no Brasil entre 1982 e 2019, uma média de 13 novos pacientes por ano.
Sem tratamento adequado, o doente pode morrer antes de completar 20 anos. Já com o diagnóstico precoce e o devido acompanhamento médico, o paciente pode desacelerar o avanço da doença e aprender a conviver com ela, levando uma vida mais tranquila. “Se fizermos o diagnóstico precoce da MPS, o paciente terá uma resposta maior ao tratamento e ele e sua família terão uma qualidade de vida”, explica a geneticista Dra. Ana Maria Martins.
No caso das Mucopolissacaridoses (MPS), não há cura, mas com tratamento adequado é possível controlar a doença e aumentar a expectativa de vida do paciente. Hoje, os médicos recorrem à reposição de enzimas como intervenção terapêutica, que se mostrou eficiente. Estudos apontam que novas enzimas são capazes de cruzar a barreira sangue-cérebro, permitindo tratar, inclusive, as manifestações neurológicas.