Dia Nacional de Combate ao fumo: vaping é a nova onda e preocupa autoridades da saúde
No dia 29 de agosto é comemorado, no Brasil, o Dia Nacional de Combate ao Fumo. A data foi instituída em 1986 pela lei nº 7488, com o objetivo de conscientizar e mobilizar a população sobre os riscos decorrentes do uso do cigarro.
O tabagismo é a principal causa de morte evitável no planeta, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Estima-se que cerca de 200 mil pessoas percam a vida todo o ano no Brasil por conta do fumo. E, na perspectiva mundial, esse número salta para cerca de 4,9 milhões.
O cigarro e outros produtos derivados do tabaco não possuem uma quantidade segura de consumo. Para se ter uma ideia, somente na fumaça do cigarro há mais de 4.700 substâncias tóxicas, algumas inclusive cancerígenas.
A nicotina é uma delas e age como como estimulante do sistema nervoso central, eleva a pressão sanguínea e a frequência cardíaca, diminui o apetite e desencadeia náusea e vômito. Por essa e outras razões, o cigarro eletrônico também é prejudicial à saúde para fumantes ativos e passivos. Esse produto também expõe o usuário à nicotina, muitas vezes em níveis semelhantes ao do cigarro comum.
No Brasil, inclusive, os DEFs (dispositivos eletrônicos para fumar), como são chamados os cigarros eletrônicos, são proibidos pela Anvisa por meio da resolução RDC 46/2009 justamente pela falta de evidências de que o uso desses produtos é seguro. Os especialistas reforçam que está é uma medida que deve ser mantida, apesar do forte apelo da indústria do tabaco para flexibilizar a resolução.
A psiquiatra e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (ABEAD), explica que os dispositivos de vaping foram introduzidos no mercado nos Estados Unidos, em 2007, supostamente como auxiliares para parar de fumar. No entanto, ela alerta que já existem estudos que mostram que os níveis de toxicidade podem ser tão prejudiciais quanto os do cigarro tradicional, já que combinam substâncias tóxicas com outras que muitas vezes apenas mascaram os efeitos danosos.
Os dispositivos da vaping têm se tornado cada vez mais populares, principalmente entre os jovens. Trata-se de um mercado muito lucrativo, uma vez que as vendas no varejo de cigarros eletrônicos e dispositivos de vaping aproximam-se de US $ 7 bilhões anuais nos Estados Unidos. As campanhas de marketing de cigarros eletrônicos parecem imitar a mesma fórmula já usada com bastante sucesso pela indústria do tabaco anteriormente ao ligar seu consumo a noções de liberdade, rebeldia e glamour. As propagandas naquele país também fazem alegações infundadas sobre benefícios à saúde e cessação do tabagismo e utilizam sites com endossos de médicos, semelhantes às velhas estratégias feitas pelas empresas de tabaco em anúncios de cigarros de nicotina anteriormente.
No Brasil, em 2018, a ACT Promoção da Saúde – uma organização não governamental que atua na promoção e defesa de políticas de saúde pública, especialmente nas áreas de controle do tabagismo – se uniu a outras entidades e denunciaram a indústria do tabaco por fazer parceria com influenciadores digitais para promover irregularmente seus produtos. Com os cigarros eletrônicos estratégias semelhantes já foram identificadas em vários países. A razão disso é uma só: atrair jovens para o consumo.
Na contramão da publicidade, Alessandra Diehl afirma que os cigarros eletrônicos não são aconselháveis para parar de fumar. “O tabagismo é uma doença curável, com altos índices de sucesso. No entanto, os fumantes devem procurar tratamentos baseados em evidências com a ajuda especializada. Os cigarros eletrônicos representam um risco e não são uma boa estratégia para quem quer largar o tabaco. Muitos usuários, sobretudo os jovens, acreditam que os aparelhos para o vaping são seguros, achando que a fumaça é apenas o vapor de água. Contudo, esse líquido contém substâncias como o glicerol e propileno glicol que podem originar substâncias cancerígenas depois de aquecidas. Além disso, a adição de nicotina em muitos deles, não vai diminuir a dependência dessa substância e a habituação ou ritualização do fumar em parte é mantida”, pontua a psiquiatra.
A nova onda
Para se ter uma ideia da propagação dos dispositivos de vaping entre os jovens escolares, uma pesquisa realizada desde 1975, chamada Monitoring the Future, mostra que, em 2018, 20,8% dos alunos do ensino médio dos EUA relataram usar cigarros eletrônicos por mais de 1 dia nos 30 dias anteriores: um aumento significativo de 1,5% em comparação a um estudo anterior, realizado em 2011. Além disso, 11,3% dos alunos do ensino médio afirmaram usar 2 ou mais tipos de produtos do tabaco. A porcentagen chegou a 4,9%, o que significa quase 1 em 20 alunos. Em 2011 o índice era bem menor, apenas 0,6% dos alunos dessa faixa etária tinham contato com essa substância.
Na França, os usuários diários de cigarros eletrônicos representam 2,5% dos indivíduos de 15 a 75 anos. Nesse mesmo país, entre os jovens com menos de 17 anos, 52,4% já experimentam os cigarros eletrônicos. Na pesquisa anterior, 16,8% usaram no último mês e 1,9%, diariamente.
No Brasil, que é um dos primeiros países a proibir o cigarro eletrônico, em 2009, a prevalência de vaping é ainda consideravelmente baixa em comparação a outros países em torno de 0,43%.
Na opinião de Alessandra Diehl, esse aumento, sobretudo nos Estados Unidos, é parcialmente impulsionado por uma falsa percepção pública de que o vaping é inofensivo, ou pelo menos, pouco prejudicial quando comparado ao fumar cigarros. “Os fãs dos cigarros eletrônicos também argumentam que os fumantes atuais podem usar os dispositivos como uma “terapia de reposição de nicotina” para ajudá-los a parar de fumar. No entanto, as pesquisas sobre os efeitos dos cigarros eletrônicos na saúde, embora ainda limitadas, estão se acumulando rapidamente, tornando-se cada vez mais evidente que esse hábito está longe de ser inofensivo”, ressalta.
Porta de entrada para a dependência química
Outro fator que preocupa as autoridades na área da saúde é que, para os jovens, os dispositivos de vaping são uma porta de entrada para a dependência de nicotina e de outras substâncias, uma vez que, em muitos casos, existe o uso do cigarro eletrônico juntamente com óleos de cannabis, que causam dependência e danos igualmente às outras formas de maconha fumada. “Este parace ser um novo jeito de fumar a erva sem produzir o característico cheiro da maconha. Muitos jovens podem fumar essa substância na forma de vaping dentro de casa e seus pais nem desconfiarem, alerta”.
Alessandra enfatiza ainda que, além disso, há muitos relatos de doenças respiratórias graves e até mortes relacionadas com vaping. Os casos relatados são de lesão respiratória, incluindo pneumonia eosinofílica aguda, desenvolvimento de pneumonia, síndrome da dificuldade respiratória aguda e pneumonite por hipersensibilidade. Também existe uma preocupação com relação a exposição passiva de fumaça por terceiros”, informa Alessandra.
Ela acrescenta que esse pensamento de que o cigarro eletrônico ajuda as pessoas a pararem de fumar é contestatória. “Os levantamentos mostram resultados distintos, sugerindo a necessidade de ainda ampliar estudos randomizados e controlados para melhor avaliar esta questão. Alguns estudos descobriram que os fumantes usam, na verdade, os cigarros eletrônicos para manter seu hábito em vez de parar completamente. Tal como acontece com as informações de segurança, os resultados a longo prazo em relação ao uso de dispositivos de vaping para cessação do tabagismo ainda não foram estabelecidos, pois esta forma de uso ainda é relativamente nova”, finaliza Alessandra Diehl.